“Na Justiça do Trabalho de Minas é possível observar a grande incidência de ações trabalhistas envolvendo empregados vítimas de acidentes biológicos. Exemplo disso é a reclamação trabalhista julgada pela juíza substituta Cristiana Soares Campos, na 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. No caso, ficou comprovado que a faxineira foi vítima de acidente de trabalho em duas ocasiões, decorrente de perfurações por agulhas contendo material contaminado. Os acidentes ocorreram no hospital público onde a trabalhadora prestava serviços e lhe ocasionaram muitos transtornos. Isso porque, durante longo período, ela teve que se submeter a uma bateria de exames laboratoriais para detectar uma possível contaminação com o vírus da Aids e outras doenças, fato que despertou na faxineira um sentimento de angústia. Diante desse quadro, a magistrada decidiu que o hospital reclamado e a empresa prestadora de serviços devem responder pelos transtornos causados à trabalhadora.
A faxineira relatou que, ao recolher uma caixa contendo material hospitalar, teve perfurado um dedo da mão direita por uma agulha que rompeu as paredes do recipiente. Ela ainda sofreu outro acidente, nas dependências do hospital, quando recolhia um saco contendo lixo hospitalar, ocasião em que teve a região mediana da perna direita escoriada por uma agulha usada. Quanto ao segundo acidente, a faxineira afirmou que o lixo com o qual se contaminou era proveniente da área mais crítica do hospital - o pronto atendimento - local em que se encontram pacientes que sequer sabem de suas doenças, sendo muitos deles portadores de HIV, hepatite, dentre outras. A faxineira alegou que, desde o primeiro acidente, passou a fazer uso de medicação controlada, tendo utilizado coquetel de remédios anti HIV, o que lhe causou inúmeros transtornos, já que era obrigada a conviver com a ideia apavorante de ter sido contaminada pelo vírus da Aids.
Em sua análise, a magistrada acentuou que é compreensível a angústia vivenciada pela trabalhadora, pois é sabido que inexiste um diagnóstico seguro indicativo de não contaminação por HIV nos primeiros testes realizados, tanto assim que é indicada a repetição dos testes laboratoriais até o prazo de seis meses após o acidente e, ainda, o uso de medicamentos. Para a juíza, é inegável que essa incerteza desencadeia desconforto e sofrimento desde o momento do acidente, tendo em vista que os próprios métodos científicos disponíveis não podem aliviar o medo da contaminação antes de se esgotar o prazo de seis meses. Ressaltou ainda a magistrada que não há como considerar o acidente uma simples fatalidade, pois é certo que ocorreu uma falha institucional, já que não foram observados os procedimentos rotineiros de descarte de material hospitalar contaminado, nos termos das normas de biossegurança.
Se agulhas com material contaminado rasgaram a caixa e o saco de lixo onde estavam acondicionadas é porque, certamente, não foram observadas corretamente todos as medidas de segurança cabíveis para um descarte seguro desse material perfurcortante, não sendo admissível que os empregados possam ficar à mercê de um grave risco como esse, ponderou a julgadora. E mesmo que se entenda de forma diferente, lembrou a magistrada que a faxineira desenvolve atividades de risco acentuado no hospital, o que já é suficiente para atrair a responsabilidade objetiva. Assim, considerando incontestável o drama vivenciado pela trabalhadora diante da real possibilidade de contaminação pelo vírus HIV, a juíza sentenciante condenou a empresa prestadora de serviços e o hospital, este de forma subsidiária, ao pagamento de uma indenização por danos morais, fixada em R$10.000,00. O TRT de Minas manteve a condenação.
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