"“Eu não sei mais quem é meu chefe
Eu não sei mais quem é meu patrão
Recebo ordens de todos os lados
Mas não sei quem me dá o pão...”
Os versos acima fazem parte do poema do juiz do trabalho da Bahia, Rodolfo Pamplona Filho, e foram lidos por dois juízes, do Sudeste e do Nordeste, durante a oficina pedagógica que antecedeu o seminário “O Futuro da Proteção Jurídica do Trabalho – II”, que acontece na sede do TRT-PR, em Curitiba (20 e 21/02). O poema completo encontra-se no final do texto.
A oficina pedagógica tratou das relações de trabalho atuais e dos critérios adotados na distinção de seus personagens (empregado, empregador, trabalhador autônomo). A primeira parte da oficina, apresentada pelo Juiz do Trabalho Marcus Menezes Barberino Mendes, do TRT-15, enfatizou um destes critérios: a subordinação.
O magistrado lembrou que nas novas relações de trabalho a distinção entre empregado e empregador já não é tão simples. Com a superposição de empresas na cadeia produtiva, por meio de terceirizações, por exemplo, o conceito de subordinação acaba perdendo força. Barberino defende a adoção de um conceito chamado por ele de subordinação estrutural-reticular, em que se busca determinar o beneficiário final do trabalho prestado, mesmo que indiretamente.
Na sequência, o juiz do trabalho Murilo Carvalho Sampaio Oliveira, do TRT da Bahia, defendeu a retomada do critério da dependência econômica, ressaltando que este conceito não pressupõe pobreza ou viver de salário.
Murilo ilustrou sua posição, em que a dependência econômica é mais determinante do que a subordinação, com a dinâmica das franquias. Segundo ele, o franqueado é altamente subordinado à franquia – que determina estratégias, preços, layout das lojas – mas ainda é proprietário da unidade franqueada.
Ambos destacaram casos práticos, em que empresas usaram as contratações indiretas, sob várias roupagens, para se eximirem de obrigações trabalhistas.
No encerramento da oficina, que teve a intermediação do juiz do Trabalho do TRT do Paraná, Leonardo Wandelli, os juízes Barverino e Murilo leram juntos o poema Desestruturação Produtiva, do também juiz do trabalho, Rodolfo Pamplona Filho.
Desestruturação Produtiva
Rodolfo Pamplona Filho
Eu não sei mais quem é meu chefe
Eu não sei mais quem é meu patrão
Recebo ordens de todos os lados
Mas não sei quem me dá o pão...
Já fui parte da organização:
o orgulho da minha seção,
mas a tal reengenharia
alterou a filosofia...
Falam de flexibilização
Em um mundo globalizado
Só que deixaram todos na mão
sem olhar para o lado...
Realmente tudo na China
é produzido mais barato.
Vendem aqui mesmo na esquina
Sem se ater a um simples fato
Que o que nos leva a ser feliz
é ter uma vida normal
e não ser aprendiz
de um dumping social
Todo o sistema mudou...
Não faz sentido falar em nação...
Graças a isso, virei consumidor
não sou mais povo, nem cidadão
A mídia nos transformou em público,
que pagou e quer o serviço
não se fala mais em direito,
nem se pensa em compromisso... A era do emprego já passou...
O que se quer é flexsegurança
Em que consumido eu é que sou
E o Estado cuide dos que não têm esperança...
Por que subordinação, e não dependência?
Quem disse que necessidade é indecência?
Por que cada um cuidar do seu e nada mais?
E, depois, o Estado é que exclui os marginais...
O espelho precisa realmente se quebrar
e se converter em um multifacetado cristal
para olhar o outro sem repúdio ou pesar
e recuperar aqueles que sofrem o mal
Já mudei de nome várias vezes,
como mudo de empresa em poucos meses
Fui temporário, estagiário,
Cooperado, terceirizado
Já fui PJ, já fui parceiro
Fui colaborador, já fui meeiro
Fui precário, em experiência
Fui autônomo ou outra crença
Fui mobília da casa, tombado,
Membro da família, agregado
Dependente ou parassubordinado,
só não deixei de ser explorado...
Ciudad Real, 16 de setembro de 2008"