"Encerrando as atividades da 8ª Semana Temática da Formação Inicial Continuada do Magistrado até o Vitaliciamento, a Escola Judicial do TRT da 15ª Região promoveu na manhã desta sexta-feira (26/10) a mesa-redonda "A atuação do sindicato em juízo", reunindo o desembargador aposentado José Antonio Pancotti, mestre em Direito Constitucional pela UniToledo de Araçatuba, e o professor da Unicamp José Dari Krein, doutor em Economia Social e do Trabalho.
O evento, realizado no auditório do 3º andar do edifício-sede do Tribunal, em Campinas, foi aberto pela vice-diretora da Escola, desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani, e contou com a participação do desembargador José Otávio de Souza Ferreira, da 2ª Câmara do TRT. Além dos 42 juízes "vitaliciandos", a mesa-redonda foi acompanhada também por outros magistrados, servidores e estagiários do Regional.
Professor de Direito e Processo Civil na UniToledo de Presidente Prudente e na Universidade Estadual de Londrina, o desembargador Pancotti iniciou sua exposição ressaltando que, embora todos reconheçam o papel do sindicato na defesa de direitos coletivos da categoria que representa, a legitimidade de sua atuação em defesa de direitos e interesses individuais dos integrantes da categoria sempre foi objeto de divergência entre os juristas. Segundo o magistrado, que dirigiu a Escola Judicial da 15ª Região de dezembro de 2010 até sua aposentadoria, em maio de 2012, a controvérsia tem origem na redação do artigo 513 da CLT, o qual estabelece como prerrogativa dos sindicatos a representação, "perante as autoridades administrativas e judiciárias, dos interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal ou dos interesses individuais dos associados relativos à atividade ou profissão exercida". Tal entendimento, afirmou Pancotti, teria sido reforçado pelas leis de política salarial aprovadas no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, que reconheceram a legitimidade dos sindicatos para substituir processualmente apenas os seus associados.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, contudo, lecionou o desembargador, consagrou-se uma nova visão sobre as prerrogativas sindicais. Além da representação dos interesses coletivos da categoria, o legislador constituinte autorizou o sindicato a atuar como substituto processual na defesa de interesses individuais de todos os integrantes da categoria (artigo 8º, inciso III), sob o fundamento de que quase todas as ações trabalhistas no Brasil são ajuizadas por trabalhadores desempregados, posto ser praticamente impossível permanecer no emprego no País após o ajuizamento de qualquer demanda judicial contra o empregador.
No âmbito da Justiça do Trabalho, explicou Pancotti, a questão foi disciplinada em 1993 pela Súmula 310 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), com a qual a Corte, preocupada em dar maior concretude ao conceito de categoria, fixou o entendimento de que "em qualquer ação proposta pelo sindicato como substituto processual, todos os substituídos serão individualizados na petição inicial e, para o início da execução, devidamente identificados". Felizmente, segundo o desembargador, a Súmula 310 foi cancelada pela Corte em 2003, diante do posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, e hoje pacífico entre os ministros, de que a substituição processual pelos sindicatos é abrangente tanto do ponto de vista subjetivo, compreendendo todos os integrantes da categoria, quanto do ponto de vista objetivo, abarcando também a liquidação e execução dos créditos dos trabalhadores, o que torna desnecessária a autorização expressa dos substituídos.
Outro ponto destacado pelo palestrante foi a nova competência da Justiça do Trabalho para julgar ações relacionadas à defesa dos interesses do sindicato, atribuída pela Emenda Constitucional 45, de dezembro de 2004. Segundo Pancotti, nos termos da nova redação do inciso III do artigo 114 da Constituição Federal, cabe ao Judiciário Trabalhista processar e julgar "as ações sobre representação sindical, tanto as que envolvem um sindicato contra outro, quanto as que têm como partes sindicatos e trabalhadores ou sindicatos e empregadores", o que, de acordo com o magistrado, compreende, entre outras, ações declaratórias de representação sindical, de cobrança de contribuição sindical e de disputa de representação, inclusive medidas cautelares que, por exemplo, suspendam eleições ou o registro de chapas. Para o desembargador, a EC 45 atribuiu ao magistrado do trabalho o controle jurisdicional inclusive dos atos de administração sindical, cabendo-lhe julgar, caso demandado, a regularidade da convocação de assembleias gerais, a lisura de eleições sindicais, a legalidade das sanções cominadas aos associados, os abusos em greves, a responsabilidade fiscal dos sindicatos, a hipótese de reparação de danos por corrupção na gestão sindical e até mesmo o que Pancotti chamou de "mensalão sindical", ou seja, a "compra" de dirigentes pelas empresas, entre outras práticas que impedem o exercício da liberdade de ação sindical. No julgamento dessas questões, concluiu o magistrado, o Judiciário Trabalhista deve pautar-se pelos mesmos princípios da moralidade, da legalidade, da eficiência, da transparência e da impessoalidade que regem a Administração Pública.
Com graduação em Filosofia pela PUC do Paraná e mestrado e doutorado em Economia Social e do Trabalho pela Unicamp, José Dari Krein, o segundo palestrante, focou sua exposição nas perspectivas da atuação sindical. Professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp e diretor do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), conselho formado por representantes do IE e do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Krein defendeu que os conflitos capital-trabalho e a judicialização desses conflitos, não apenas os individuais, mas sobretudos os coletivos, tendem a crescer nos próximos anos. "O crescimento das demandas individuais, hoje em torno de 3 milhões de ações por ano em toda a Justiça do Trabalho, não surpreende, considerando os cerca de 15 milhões de pessoas que trabalham sem registro em carteira no País e o baixo cumprimento das leis trabalhistas. O que eu projeto de novo é uma explosão de conflitos coletivos, que pode ser relacionada à pulverização da organização sindical brasileira."
Segundo o professor, nos anos 1980, com a redemocratização do País, assistimos a uma revitalização dos sindicatos, com a criação de novas entidades em várias categorias e a interiorização das relações sindicais. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, lecionou Krein, é definido um sistema híbrido, com elementos liberalizantes, como a liberdade de organização estatutária para as organizações sindicais e a eliminação do enquadramento sindical, mas preservando institutos da estrutura sindical montada nos anos 1940, como a unicidade sindical e a contribuição sindical obrigatória. Para o professor, o novo sistema intensificou a tendência, que já vinha sendo observada nos anos 1980, de proliferação de novas entidades sindicais e de desmembramento das já constituídas, "com a diferença de que o movimento sindical nos anos 1990 já não apresentava a mesma capacidade de mobilização coletiva demonstrada na década anterior". Krein afirmou, no entanto, considerar equivocada a ideia de que sindicatos mais específicos, em termos de setor econômico ou abrangência geográfica, sejam mais representativos. Segundo ele, é justamente essa visão que permite o surgimento de sindicatos frágeis, sem nenhuma representatividade ou capacidade de ação coletiva, com comportamento meramente cartorial.
Para Krein, a situação foi agravada com o reconhecimento oficial, em 2008, de cinco centrais sindicais, medida que, segundo ele, visou meramente garantir o acesso dessas entidades a uma parcela da contribuição sindical, uma vez que elas já eram reconhecidas politicamente. O resultado, de acordo com o professor, foi não só o enterro da perspectiva de uma reforma sindical a curto prazo, mas a consagração de uma estrutura sindical "frankstein", caracterizada pelo pluralismo na cúpula sindical e pela unicidade na base. Entre outros efeitos, afirma o palestrante, essa estrutura tem provocado o acirramento da disputa das centrais pela afiliação dos sindicatos, com evidentes reflexos na Justiça do Trabalho.
Diante desse cenário, o professor defendeu que a Justiça do Trabalho deve assegurar não apenas a transparência absoluta das ações sindicais, mas também a democracia interna dos sindicatos. Segundo Krein, não há garantia de igualdade entre situação e oposição em muitas eleições sindicais. Frequentemente, revela ele, muitas vezes a oposição sequer tem acesso à lista dos votantes. O professor preconizou também que, nos litígios sobre representação sindical, sejam ouvidos todos os interessados diretos, por meio de um plebiscito, a exemplo do que determina a CF no que diz respeito à criação de novos municípios.
Na avaliação do palestrante, os anos 2010, embora menos favoráveis economicamente que a década anterior, têm sido marcados por uma taxa relativamente baixa de desemprego, o que tende a aumentar o poder de barganha dos trabalhadores e a intensificar ainda mais o conflito capital-trabalho. "Tendo em vista o número de greves deflagradas em 2012, podemos crer que os conflitos vão aumentar, e as partes tenderão a bater às portas da Justiça do Trabalho."
Encerrando a mesa-redonda, a desembargadora Tereza Asta sublinhou a necessidade de se avançar na discussão sobre a representatividade sindical, uma vez que "a fratura do artigo 8º da Constituição continua exposta". A desembargadora questionou o modelo sindical atual, em que todo trabalhador integra a categoria mas só o associado vota, e, fazendo coro com os palestrantes, preconizou que o juiz do trabalho atue como garantidor da democracia do processo eleitoral sindical."