“Quase 6% das crianças de 10 a 13 anos trabalhavam no Paraná em 2010, segundo o Ipardes. Há dez anos, índice era menor
Publicado em 20/05/2012 | Katia Brembatti
Apesar da criação de políticas públicas de compensação de renda para incentivar que crianças apenas estudem e brinquem, o trabalho infantil aumentou no Paraná na última década. Entre 2000 e 2010 o índice de crianças que trabalham no estado cresceu 19%. A pedido da Gazeta do Povo, o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes) analisou os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados no fim de abril. O índice paranaense está no mesmo patamar das taxas do Ceará e de Pernambuco. Os números do IBGE também indicam crescimento no porcentual de trabalho infantil no período no Brasil. Os registros só apontam queda na faixa etária de 14 a 17 anos (trabalho juvenil) – tanto no panorama nacional como no estadual.
O censo indicou 42.118 casos no Paraná – que representam 5,8% do total de crianças de 10 a 13 anos. Em 2000, eram 36.458 registros, o equivalente a 4,9% das crianças da mesma faixa etária. No Brasil, 12 estados tiveram crescimento na quantidade proporcional de casos de trabalho infantil. Já os registros de trabalho juvenil aumentaram em quatro estados. Em 2000, 700 mil garotos e garotas de 10 a 13 anos e 3,2 milhões de jovens com menos de 18 anos trabalhavam no país. Dez anos depois, foram encontrados 710 mil crianças e 2,6 milhões de adolescentes. Os casos de crianças com menos de 10 anos que trabalham não são identificados pelo IBGE.
Benefício
Saiba como funciona o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti):
- O que é: o Peti paga uma bolsa às famílias de crianças que tenham sido encontradas em situação de trabalho.
- Quem recebe: famílias cuja renda por pessoa seja superior a R$ 140 por mês.
- Quanto paga: R$ 40 por beneficiário em cidades com mais de 250 mil habitantes e R$ 25 em municípios menores.
- Condições: as crianças e os adolescentes beneficiados precisam estar matriculados na escola e ter frequência mínima de 85%. Devem ter a carteira de vacinação em dia e ter o desenvolvimento acompanhado nos estabelecimentos de saúde. Atividades recreativas são programadas no contraturno escolar para ocupar o tempo dos jovens e a participação é obrigatória. O governo ajuda a financiar projetos no contraturno escolar. No Paraná são repassados R$ 755 mil por mês para essas atividades.
- Restrição: Beneficiários do Bolsa Família não têm direito à bolsa do Peti. O Bolsa Família atende lares com renda inferior a R$ 140 por morador.
Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social.
Ações públicas caminham lentamente
Há quase um ano, a presidente Dilma Rousseff anunciou que investiria recursos para tirar 1,2 milhão de crianças do trabalho infantil até 2014. Desde o anúncio, medidas foram discutidas dentro do governo federal, mas nada foi mudado. A promessa é que em 12 de junho de 2012 – Dia de Combate ao Trabalho Infantil – as novas ações sejam divulgadas. Já no Paraná, há mais de um ano está em elaboração o Plano Estadual de Erradicação de Trabalho Infantil.
A Secretaria de Estado da Família e Desenvolvimento Social aceitou comentar o caso apenas por e-mail. Sobre o crescimento no número de casos de trabalho infantil no Paraná, a resposta é que as informações permitirão “uma análise criteriosa das causas que determinam a permanência do trabalho precoce no estado e a variação de índices em algumas regiões”.
Como houve redução em algumas áreas e crescimento em outras, não é possível apontar “causas específicas para qualquer dos comportamentos”.
A grande aposta da secretaria é o programa Família Paranaense, que prevê acompanhamento de 100 mil núcleos familiares por dois anos.
“A erradicação do trabalho infantil não é vista por esse governo apenas como uma questão que será solucionada com programas de transferência de renda (bolsas) e sim com ações intersetoriais articuladas para tirar essas crianças e adolescentes da situação de vulnerabilidade social em que se encontram”, diz o texto enviado pela secretaria.
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Os dados mostram que o Brasil está muito longe de cumprir o compromisso internacional de erradicar o trabalho infantil até 2020. Na realidade, a expectativa de pesquisadores e ativistas pelos direitos humanos era de que houvesse redução no número de casos. Algumas formas de exploração da mão de obra de crianças e adolescentes têm sido combatidas, mas a fiscalização encontra dificuldades de coibir ações em fazendas, atividades familiares e serviços domésticos. No cultivo de fumo no Paraná, por exemplo, estima-se que 4 mil menores de idade trabalhem, sendo 1,1 mil com menos de 13 anos.
Invisíveis
Apesar dos números exorbitantes, os dados do Censo do IBGE podem não ter identificado todos os casos de trabalho infantil. Quem presta informações ao censor nem sempre confessa que as crianças da casa têm responsabilidades incompatíveis com a idade. De acordo com o Ipardes, vários estudos sobre o trabalho infanto-juvenil têm utilizado o conceito de trabalho invisível.
Muitas vezes a atividade exercida não é remunerada – como nos casos de serviços domésticos. Ainda sujeitas a uma subcontagem censitária estão meninos e meninas relegadas às ruas da cidade. Além de casos escusos, foram registradas situações de trabalho infantil autorizadas pela Justiça. Desde 2005, o Judiciário permitiu que 33 mil crianças e adolescentes no Brasil – 2,6 mil no Paraná – tivessem alguma atividade laboral.
Para Anael Cintra, coordenador do Núcleo de Estudos Populacionais e Sociais do Ipardes, o crescimento nos números absolutos e proporcionais de menores de 13 anos trabalhando indica que algumas ações de combate não tiveram o resultado esperado. Ele ainda destaca que enquanto algumas cidades registraram quedas acentuadas, outras apresentaram um crescimento exagerado no número de registros, que indicam a disparidade social e econômica do Paraná.
Valor da bolsa paga pelo Peti é irrisório
O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) nasceu em 1996 com a missão, como o próprio nome sugere, de eliminar todo e qualquer tipo de exploração da mão de obra de crianças. Mas, passados 16 anos, os números do Censo do IBGE indicam que o trabalho infantil não apenas não foi erradicado, como aumentou.
Crianças e adolescentes encontrados em “situação de risco de trabalho” passam a receber uma bolsa mensal como complemento de renda familiar. Se a renda por pessoa na casa for inferior a R$ 140, há a inclusão no programa Bolsa Família. Nos casos de renda per capita superior a R$ 140, a família é cadastrada no Peti. O valor da bolsa varia de R$ 25 a R$ 40. Hoje o programa beneficia 800 mil crianças e adolescentes no Brasil e 30 mil no Paraná.
Insuficiente
Como deixam claros os números do Censo, a quantidade de bolsas oferecidas é inferior ao número de crianças e adolescentes trabalhadores. E o programa hoje não chega a quem não tenha sido flagrado com filhos trabalhando. A lei determina que apenas adolescentes com mais de 16 anos podem trabalhar. Entre 14 e 16 anos podem apenas atuar como aprendizes. E com menos de 14 anos o trabalho é proibido.
Procuradora do Ministério Público do Trabalho em Curitiba, Cristiane Sbalqueiro Lopes espera por iniciativas mais efetivas, mas vê avanços no combate ao trabalho infantil. “Com relação ao trabalho nas ruas, por exemplo, diminuiu bastante.” Para ela, a situação continua complicada principalmente no meio rural, onde a fiscalização tem mais dificuldade de chegar.
“A criança deve brincar. Não pode ter sobre os ombros o peso de ajudar a sustentar a família. O pai e a mãe não devem ver o filho como uma fonte de renda. Mas nos casos em que a necessidade fala mais alto, é preciso ter um suporte que garanta o sustento.”
Cristiane acredita nas potencialidades do Peti. Para a procuradora, o problema é que o programa não tem sido suficiente. “Se ainda tem criança trabalhando é porque está faltando bolsa do Peti.” Ela também considera necessário aumentar o valor do repasse. “É muito pouco R$ 25.” “