"Ausência de mecanismos que limitem a demissão imotivada; baixa preocupação do empresariado com o investimento em qualificação de empregados; disponibilidade de oferta de mão de obra (ou ocupada de maneira precária) sem proteção laboral e social; baixa escolaridade dos empregados; e substituição de trabalhadores mais antigos pelas empresas, como forma de reduzir o custo do trabalho. Seriam esse alguns dos principais motivos para o aumento da rotatividade no emprego, segundo estudo apresentado pelo Dieese em parceria com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
O trabalho foi divulgado nesta terça-feira (11), durante seminário realizado na sede do Ministério, com o objetivo de discutir entre representantes de diversos setores, além do Executivo e Legislativo, alternativas de políticas públicas para ajudar a combater o problema, que tem como consequências, para o trabalhador, a não elevação de seu nível de qualificação e a precarização do emprego. Para o setor público, a ampliação de despesas com o seguro-desemprego.
"Não existe aqui uma bala de ouro, uma única medida capaz de resolver esse problema, que é complexo. O convite para essa atividade é um grande desafio. Temos de abrir o diálogo sobre o tema, que é polêmico e exigirá esforços de todos nós para enfrentá-lo", afirmou o diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio.
Conforme o trabalho, apresentado por vários pesquisadores, um terço dos vínculos de emprego existentes durante o ano (contratos de trabalho) no país, costumam ser rompidos por iniciativa do empregador, o que causa a condição para o acesso ao seguro-desemprego.
Esse percentual já não leva em conta as substituições decorrentes de falecimento, aposentadoria, desligamento a pedido do trabalhador, transferências e demais situações que não caracterizam motivos para requerer o seguro.
Estrutura heterogênea
Embora se esperasse que a redução do desemprego levasse à diminuição da pressão sobre o seguro-desemprego, como acontece na Europa, isso não ocorre no Brasil. Conforme avaliação do Dieese, o mercado de trabalho brasileiro, além de apresentar, no início dos anos 2000, as maiores taxas de desemprego de sua história, ainda o fazia sobre uma estrutura ocupacional heterogênea, com informalidade alta e crescente.
Sendo assim, ao mesmo tempo em que na última década houve redução de desemprego e aumento da formalização do mercado de trabalho, também cresceu o universo de trabalhadores incluídos no sistema de proteção com o seguro-desemprego. Passou também a existir demanda por uma força de trabalho que não é respondida em quantidade e qualidade.
"Isso pode estar acontecendo por diferenciação da alocação da demanda e oferta no território; por desequilíbrios entre as ocupações oferecidas e os profissionais existentes e disponíveis; por déficit de qualificação por parte do trabalhador; pela baixa qualidade dos postos de trabalho oferecidos ou pelos baixos salários, entre outros motivos", explicou o professor Sílvio Pessoa, do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), que acompanhou o estudo.
Até existem casos em que a mudança do emprego é feita por escolha do trabalhador, por ter encontrado uma condição melhor, o que é positivo. O que preocupa os estudiosos, porém, são os casos em que o trabalhador é demitido por conveniência do empregador. A rotatividade, aí, é negativa, porque esse trabalhador precisa se submeter posteriormente a salários mais baixos e menos benefícios para se manter no mercado de trabalho - o que leva a uma situação de precarização das relações trabalhistas, conforme explicou o ministro titular da pasta, Manoel Dias.
Segundo o secretário de Políticas de Previdência Social do Ministério da Previdência Socal (MPS), Leonardo Rolim, uma das causas desse problema é o fato de a atual legislação brasileira induzir à rotatividade. "É preciso que haja mudanças para reter os trabalhadores nas empresas. As empresas perdem produtividade, o trabalhador perde direitos e o governo tem despesa. Hoje, a nossa legislação induz à rotatividade. Temos como desafio mudar essa lógica, ter uma legislação que induza os trabalhadores a ficarem mais tempo nas empresas", completou ele.
José Lopes Feijóo, assessor especial da Secretaria-Geral da Presidência, destacou que é preciso olhar melhor para o mercado de trabalho brasileiro para que se consiga descobrir como controlar taxas tão altas de rotatividade "Do lado empresarial, há queixa constante de que é caro demitir. Do lado dos trabalhadores, de que a demissão é feita para reduzir custos. São lógicas que não batem", observou.
Proporção e encargos
De acordo com o pesquisador e professor Carlos Baltar, da Unicamp, os estudos a serem feitos daqui por diante precisam levar em conta os tipos de desligamento dentro dessa rotatividade e o comportamento das empresas.
"Não é fácil distinguir os dois tipos de movimento de trabalhadores, que possuem características diferentes, impactos diferentes e precisam de diferentes instrumentos para serem enfrentados. Um determinado estabelecimento pode ter um quadro de trabalhadores num mês e no mês seguinte pode ampliar o número de postos de trabalho, mas ao mesmo tempo desligar vários dos seus trabalhadores", acentuou, ressaltando ser importante cuidado na realização dessa análise.
O professor Hélio Zilberstajn, da USP, também sugeriu que, diante das mudanças observadas no mercado de trabalho nos últimos anos, sobretudo com o advento da internet, que fez com que a verticalização das empresas passasse a não ser mais necessária em vários setores, tornou-se importante que as políticas públicas passem a se preocupar com a formação de novos arranjos.
Ele citou como exemplo os casos de condomínios de fazendeiros que contratam trabalhadores em períodos diferentes e estes realizam atividades laborais em várias fazendas ao mesmo tempo, sem que precisem ser demitidos nos períodos de entressafra. O especialista sugeriu, ainda a criação de um banco de dados para trabalhadores da construção civil. "São ideias que poderiam ser pensadas dentro do enfrentamento ao problema."
Segundo dados divulgados pelo Ministério do Trabalho, em 2013 foram gastos cerca de R$ 30 bilhões com o pagamento do seguro-desemprego."