quinta-feira, 10 de março de 2011

Reunião entre Dilma e as centrais: “A arte de prosear” (Fonte: Correio Braziliense)


Brasil S.A - Antônio Machado

Dilma chama centrais sindicais para dialogar, o melhor que ela tem a oferecer por enquanto
 
Os dirigentes das seis centrais sindicais vão ser recebidos pela presidente Dilma Rousseff — enfim, poderiam dizer, pois se queixam de que foram afastados do governo desde as últimas eleições.
O então presidente Lula acomodou o sindicalismo no governo depois da crise do mensalão, com direito a palpitar em várias decisões, o que Dilma não desfez, mas sem considerar as centrais, ao menos até agora, como instâncias integrantes do processo decisório com mesmo status dos partidos que lhe dão sustentação política no Congresso.
A diferença é mais que de estilo. Lula tomava decisões conforme as disputas em seu entorno, procurando conciliar todos os interesses.
Ele tinha caixa e vento a favor da economia para ser só alegria.
Dilma, premida pelo exíguo campo de manobra da situação econômica ou por concepção de governo, tem feito diferente. Primeiro, filtra o que seria racional para o crescimento. Depois, confronta com as premissas sociais do eleitorado da base da pirâmide de renda, que tem sido o grande esteio do PT. E, então, arbitra a decisão.
A restrição orçamentária é o seu maior constrangimento. Com caixa limitado por despesas incompressíveis decididas por Lula, além dos restos a pagar da ordem de R$ 128 bilhões legados ao seu governo à margem do orçamento, ela tem de ser mais seletiva na decisão.
Essa situação não mudará nem que a economia cresça à larga, pois boa parte do gasto público é engessada em lei, como o pagamento de salários e de aposentadorias do funcionalismo, os deficits do INSS e os juros da dívida pública. Mais: o custeio de saúde e de educação é uma proporção fixa da arrecadação e a provisão orçamentária cresce de acordo com a variação do PIB para saúde e salário mínimo.

Tais dispositivos só em parte são políticas de governo, já que a maioria foi inserida por força de lei no orçamento por demandas de setores sociais ou da burocracia pública atendidas pelo Congresso a fim de cercear a discricionariedade do governante na partilha da arrecadação. Implica cassar a liberdade do Executivo para governar e do próprio Congresso para discutir e rever as prioridades.
Teia de contradições
Essa teia de contradições está no seio das questões tratadas com discrição pela presidente e sua equipe. Elas deságuam noutro tema que monopoliza por ora a sua atenção: a inflação. Ela espelha as decisões que pressionam a demanda, como o gasto público — questão tornada sensível para evitar que o choque de preços dos alimentos transborde para os demais produtos e serviços. É o que já ocorre.
Os sindicalistas de centrais como a CUT, ligada ao PT, e a Força Sindical, uma costela do PDT, vão adentrar ao Palácio do Planalto com a presidente cercada de problemas que demandam decisões, vamos dizer, nem um pouco simpáticas ao que eles gostariam de ouvir.
Origens do dissenso
O dissenso entre sindicalistas e o governo Dilma esquentou com a votação no Congresso do aumento do salário mínimo de R$ 510, em 2010, para R$ 545 este ano. Os sindicalistas, e, entre eles, vários tons acima do que se espera de um aliado, o dublê de deputado pelo PDT e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira, queriam mais.
A CUT foi menos enfática na discordância, embora continue amuada com a menor influência na ocupação de cargos do segundo escalão e o afastamento de outros, indicados por deputados do PT com origem sindical. Os critérios de Dilma não excluem sindicalistas, o que seria um contrassenso em se tratando de PT, mas ela parece querer melhorar a capacitação gerencial mesmo dos cargos comissionados.
Agenda só de gastos
Os sindicalistas tomaram como derrota o reajuste do mínimo, que é uma política de rendas sujeita às possibilidades fiscais — e não o resultado de negociações salariais, como as que os sindicatos fazem com as empresas. Tal percepção equivocada virou regra no governo Lula. As centrais querem uma compensação, tipo um aumento maior da correção que o governo aplicou à tabela do Imposto de Renda: 4,5%. Se Dilma atender, será outro ônus para o orçamento federal.
Da mesma forma, são outros dois pleitos recorrentes: fim do fator previdenciário, um redutor da aposentadoria conforme a idade, e a mudança da regra de correção de aposentadorias acima de um salário mínimo, que hoje são reajustadas apenas pela inflação passada.
Em suma: uma agenda que amplia os gastos fiscais, quando amoldar a demanda ao figurino da inflação é a prioridade imediata. E a de médio prazo é a recuperação da poupança pública para viabilizar o crescimento econômico a taxas acima de 5% ao ano sem inflação.
Desoneração onerada
Centrais sindicais e governo, na verdade, podem estranhar-se, mas sabem que são partes dependentes da coalizão de forças que governa o país desde 2003. O que ambos procuram são espaços para atuar: as centrais, para influenciar as decisões. O governo, para governar sem pedir licença aos aliados, uma das razões da divisão do poder.
Ambos imaginam que a questão da desoneração dos encargos sobre a folha de salários possa ser de interesse comum, dando às centrais um tema de negociação com o empresariado, outra ponta interessada.
O nó é o que fazer. Desoneração implica arrecadar menos, no caso, a parcela patronal da contribuição previdenciária. É algo como R$ 60 bilhões por ano. Quem paga a conta? Já é tempo de o governo deixar claro que não cria dinheiro, só transfere de um bolso para outro.”


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