"Em julgamento de recurso especial proferido no dia 24 de maio, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) emitiu um importante precedente acerca dos critérios a serem observados quanto à caracterização de uma sentença arbitral como estrangeira ou doméstica. Este precedente do STJ pode significar um importante avanço em termos de segurança jurídica na utilização da arbitragem como forma de solução de conflitos oriundos ou relacionados a contratos com a administração pública e parcerias público-privadas.
A 3ª Turma do STJ, em voto da relatoria da ministra Nancy Andrighi, entendeu por unanimidade que procedimentos arbitrais com sede no Brasil, mesmo que regidos e administrados por instituições arbitrais estrangeiras, são considerados procedimentos domésticos. Este entendimento confere às sentenças proferidas em tais procedimentos força executiva imediata, afastando a necessidade de procedimento homologatório prévio perante o Órgão Especial do próprio STJ.
No caso em concreto, a 3ª Turma reverteu decisão anteriormente proferida em sede recursal pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), que havia entendido que a eleição de instituição internacional para administração de procedimento arbitral desloca a natureza de referido procedimento, mesmo que este tenha sido processado na cidade do Rio de Janeiro, tendo seu laudo final sido emitido na mesma localidade. A exemplo de outros inúmeros precedentes importantes já criados em relação à moldura legal do instituto da arbitragem no país, os ministros, em uma clara e correta aplicação do artigo 34 da Lei de Arbitragem brasileira, reverteram o julgado do tribunal estadual ao esclarecer que a eleição de instituição estrangeira não desvirtua a nacionalidade pátria do laudo arbitral produzido, quanto este for efetivamente feito em território brasileiro.
O STJ aplicou, de forma extremamente técnica, os preceitos da Lei de Arbitragem
Embora o caso concreto não envolva contratos com a administração pública ou parcerias público privadas, sua fundamentação é de extrema importância para o uso da arbitragem como forma de solução de controvérsias surgidas destas relações. Tanto o artigo 11 da Lei de Parcerias Público Privadas, quanto o artigo 23-A da Lei nº 8987, de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos, facultam a possibilidade de uso da arbitragem nos contratos regidos por tais normativos, desde que a cláusula de arbitragem contida nos respectivos contratos estabeleça que a arbitragem será realizada no Brasil e em língua portuguesa.
O novo precedente do STJ deixa claro que a utilização de instituição estrangeira na administração do procedimento arbitral não desnatura o caráter doméstico de um procedimento arbitral, desde que este esteja sediado no Brasil e, aqui, seja proferida a sentença arbitral. Embora o país conte com excelentes centros locais para a administração de procedimentos arbitrais, muitos dos quais já existentes até mesmo antes da entrada em vigor da Lei de Arbitragem em 1996 e capazes de administrar inúmeros casos de alta complexidade ao mesmo tempo, investidores estrangeiros tendem a preferir a utilização de instituições com as quais estão mais habituados.
Como tem sido uma constante desde a reforma constitucional do Judiciário em 2005, quando o STJ passou a atuar mais próximo a questões relacionadas a arbitragem e em especial à homologação de laudos estrangeiros, mais uma vez nossa principal Corte infraconstitucional andou muito bem ao aplicar, de forma extremamente técnica e objetiva, os preceitos contidos no texto da Lei de Arbitragem, conferindo ao instituto a segurança jurídica necessária para a sua ampla utilização no território brasileiro.
A confirmação da possibilidade de uso de instituições internacionais arbitrais renomadas na administração de casos relacionados a investimentos em infraestrutura e contratos com o Estado brasileiro, sem que o uso de tais instituições desnature o caráter doméstico das arbitragens sediadas no Brasil, garante à comunidade internacional confiança na neutralidade e previsibilidade na condução de procedimentos que eventualmente possam surgir dos inúmeros serão feitos nesta área ao longo desta década.
Pedro Soares Maciel e Carlo de Lima Verona são sócios de Veirano Advogados
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