"Mesmo sem haver uma tipificação legal específica (trabalhista e infraconstitucional) que puna sua prática, o assédio moral tem sido combatido pela Justiça Trabalhista. Os magistrados recorrem à Constituição Federal, ao Código Civil e à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para embasar suas decisões. Nos últimos dez anos, chegaram às Varas da 10ª Região (Distrito Federal e Tocantins) 8.455 ações envolvendo o tema.
De acordo com o desembargador Brasilino Ramos, do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT10), a garantia maior contra o assédio moral está no artigo 1º da Constituição Federal, que preconiza entre os princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho. “Na medida em que o trabalhador é vítima do assédio moral, há uma afronta ao princípio constitucional”, aponta.
O magistrado aponta ainda que o artigo 186 do Código Civil estabelece que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Outra norma que pode ser usada para punir o assédio moral é o artigo 483 da CLT, que estabelece as hipóteses de rescisão do contrato por parte do empregado, tais como a exigência de serviços superiores às suas forças, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; o rigor excessivo no tratamento pelos superiores hierárquicos; e o não cumprimento das obrigações do contrato por parte do empregador.
“Aquele que se sentir ofendido pode e deve recorrer à Justiça. Se for regido pela CLT, deverá buscar a Justiça do Trabalho. Se for por um estatuto, deve buscar a indenização na Justiça Federal, caso seja servidor da União, ou nas Varas da Fazenda Pública, se for servidor estadual. De forma alguma, a ausência de uma legislação específica nacional, infraconstitucional, tira do trabalhador a proteção maior que a Constituição Federal lhe outorga”, aponta o desembargador Brasilino Ramos.
Terror psicológico - Segundo o magistrado, o assédio moral é caracterizado quando há a repetição de atos que objetivem constranger a pessoa, como a perseguição contumaz no ambiente de trabalho, a exigência de carga horária ou volume de trabalho superior às forças do empregado, não dar nenhum trabalho a ele, ignorá-lo, tratá-lo grosseiramente de forma reiterada, tudo com intuito claro de prejudicar a pessoa no ambiente de trabalho. “É uma prática odiosa, um verdadeiro terror psicológico contra o assediado”, diz.
O assédio moral pode ser definido em dois tipos: o vertical, o mais comum, cometido por um superior contra um subordinado, e o horizontal, quando o assediador está no mesmo nível hierárquico que a vítima. Também ocorre o vertical ascendente, quando o subordinado assedia o superior por saber de alguma informação constrangedora desse, como um caso extraconjugal, e se utiliza disso para obter benefícios.
É preciso separar, no entanto, o assédio moral de divergências pontuais no ambiente de trabalho. “Essas divergências, normalmente, são conflitos abertos. No assédio, são dissimulados. Não confundir também com uma atitude isolada. Se um dia o chefe chegou de mau humor e foi grosseiro com o trabalhador, isso pode vir a caracterizar um dano moral, porém não será decorrente do assédio moral, pois um dos requisitos é que haja repetição dos atos, com intenção deliberada de prejudicar”, explica o desembargador Brasilino Ramos.
O magistrado ressalta que o assédio moral é prejudicial a todas as partes: ao trabalhador, que é prejudicado fisicamente e mentalmente, e à empresa ou instituição, pois correm o risco de pagarem indenização alta e de verem sua imagem manchada. “É um mal que deve ser combatido. Se o ambiente de trabalho não é bom, prejudica a produtividade da empresa”, frisa.
Conscientização - O juiz Francisco Luciano de Azevedo Frota, titular da 3ª Vara do Trabalho de Brasília, destaca que as denúncias de assédio moral têm aumentado nos últimos dez anos. “Depois da Constituição Federal, que trouxe o rol de direitos fundamentais, as pessoas acordaram para essa realidade e estão tentando mudar. Há dez anos, ninguém falava em assédio moral”, salienta.
Segundo o magistrado, o assédio moral é uma “chaga social”. “Tem gente com depressão crônica por ter sido assediado por anos e não podia reagir por conta da dependência econômica, da necessidade do emprego”, diz. Na sua avaliação, para evitar situações de assédio moral no ambiente de trabalho, o empregador deve adotar políticas de esclarecimento aos subordinados para conscientizar que é necessário preservar o ambiente de trabalho saudável. “Também é preciso fiscalização, com pessoas instruídas observando como está sendo o comportamento dos empregados”, sustenta.
O juiz Francisco Luciano explica que quem é punido objetivamente no caso de assédio moral é o empregador, mesmo que não seja ele o assediador, pois ele é responsável pelos seus prepostos e empregados. “Manter o ambiente saudável é responsabilidade do empregador”, assinala. Ele lembra que qualquer pessoa que for vítima de assédio moral, independente da natureza do vínculo (estatutário, estágio ou CLT), pode requerer reparação de natureza civil, aplicada também ao âmbito trabalhista.
Propostas - No Congresso Nacional, tramitam processos que buscam tipificar o assédio moral como crime. O Projeto de Lei da Câmara 6757/10 prevê que a indenização mínima por assédio moral será de dez vezes o valor do salário do trabalhador. Pelo texto, o juiz poderá determinar que o empregador prove que não praticou o assédio para que não seja considerado culpado. Além disso, os sindicatos poderão entrar na Justiça pelos trabalhadores para obrigar as empresas a pagar indenizações e adotar medidas preventivas.
O Projeto de Lei do Senado 121/2009 pune até com demissão o servidor público acusado de praticar assédio moral contra subordinados. No entanto, quando seria votado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), surgiu uma polêmica, pois alguns senadores alegaram que a proposta fere o artigo 61 da Constituição, o qual reserva à iniciativa privativa do presidente da República as leis que disponham sobre os servidores públicos federais. O projeto foi retirado de pauta e aguarda votação."
Fonte: TRT 10ª Região
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