"Na 2ª Vara do Trabalho de Montes Claros, a juíza Simone Soares Bernardes afastou a justa causa aplicada a um vendedor acusado de praticar fraude na loja de motocicletas onde trabalhava. Segundo alegou a ré, ele teria feito uma venda em nome de terceiro que sequer tinha conhecimento do negócio, apresentando documentação falsa ao agente financeiro. Tudo para aprovar crédito para "retirada" de uma motocicleta nova. A loja sustentou que o contrato não tinha a assinatura do contratante e a motocicleta teria sido retirada pelo próprio vendedor durante o horário de almoço da funcionária responsável pelo setor, inclusive ficando o reclamante com o protocolo de entrega da motocicleta.
As acusações são graves e chamaram a atenção da magistrada pela forma agressiva e ofensiva como foram apresentadas na defesa. Contudo, não ficaram provadas. De acordo com a julgadora, a empresa tinha obrigação de provar a falta grave apontada, já que a dispensa por justa causa é "a pena capital para o obreiro, no seio da relação de emprego", nos dizeres da magistrada. Para a juíza sentenciante, muito mais verossímil se mostrou o relato do reclamante. Ele contou que a venda foi feita para uma pessoa, representada do irmão dela. O contrato foi entregue para esse irmão, que levou o documento para ser assinado e depois retirou a motocicleta da loja.
Analisando as provas, a julgadora concluiu que o procedimento adotado pelo trabalhador nada teve de irregular, sendo totalmente compatível com as exigências da ré. Ou com a falta delas. É que a empresa se mostrou desorganizada, omissa e negligente no que toca à formalização de contratos, conforme descreveu a juíza. Para ela, ficou claro que a loja não tem qualquer controle sobre vendas para clientes sem a presença pessoal deles. A prática não é proibida nem regulamentada. O representante da ré não soube esclarecer aspectos importantes da dinâmica empresarial. "A tentativa de alegar que o reclamante tinha toda autonomia para preencher os contratos e enviar ao agente financeiro sem qualquer ingerência da ré é tentar, a todo custo, transferir para o empregado, parte mais fraca da relação, os ônus da sua inaptidão no gerenciamento do empreendimento diante de uma situação de fraude", destacou na sentença.
Na avaliação da julgadora, a desorganização da empresa acaba se tornando um campo fértil para a prática de fraudes, não podendo se impor aos empregados a responsabilidade pelos prejuízos daí advindos. A falta grave que seria capaz justificar a rescisão do contrato de trabalho por justa causa não foi comprovada. Diante desse contexto, a juíza substituta declarou nula a dispensa por justa causa, convertendo-a em dispensa sem justa causa. A loja de motocicletas foi condenada a pagar os direitos decorrentes dessa forma de desligamento, bem como multa prevista no artigo 477, parágrafo 8º, da CLT, por atraso no acerto rescisório.
Em razão da postura claramente abusiva da ré, a julgadora também a condenou ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$5.000,00. A magistrada lembrou que o respeito à dignidade da pessoa humana constitui um dos fundamentos da Constituição da República, devendo ser garantido a todos os cidadãos nos diversos segmentos da sociedade. No caso, a loja causou danos morais ao acusar o empregado, sem provas, da prática de crimes, notícia que evidentemente se espalhou no ambiente de trabalho. "É óbvio que os fatos tomaram grande dimensão no ambiente laboral, gerando inclusive a dispensa por justa causa do autor, o que sem sombra de dúvidas, atingiu sobremaneira o reclamante em sua esfera moral, no seu íntimo, tanto na imagem que terceiros possuem dele, quanto na imagem que ele mesmo tem de si próprio, enquanto indivíduo e enquanto membro de uma sociedade", registrou a magistrada. A loja de motocicletas recorreu, mas as condenações foram mantidas pelo TRT da 3ª Região."
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