sexta-feira, 18 de março de 2011

“Barril de pólvora em Jirau” (Fonte: o Globo)


Autor(es): agência o globo: Cássia Almeida

Força Nacional é enviada para a usina. Obras estão paradas e não há previsão de retomada

Depois de uma rebelião de trabalhadores, com depredação de ônibus e destruição de instalações, e que levou à detenção de mais de 30 operários, a Camargo Corrêa paralisou ontem as obras de construção da Usina Hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia. Um dos principais projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o canteiro de obras de Jirau abrigava 22 mil trabalhadores e está em clima barril de pólvora desde quarta-feira. Truculência de encarregados, seguranças e motoristas é a principal queixa dos operários. E a agressão de um deles foi o estopim do protesto, que destruiu 60 veículos, praticamente todos os alojamentos da margem direita da obra, enquanto os operários da margem esquerda só conseguiram sair escoltados pela Polícia.

A pedido do governador de Rondônia, Confúcio Moura, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, mandou ontem 600 homens da Força Nacional para tentar controlar a situação. O governador também pediu tropas de Exército, Marinha e Aeronáutica para proteger paióis de explosivos e fazer a vigilância do Rio Madeira e do espaço aéreo na região. Segundo o governo estadual, os manifestantes incendiaram 45 ônibus, 15 carros, 15 alojamentos e mais de 30 diferentes instalações. O incêndio teria deixado sem abrigo 12 mil peões.

Não há previsão para o retorno das obras e, ontem, o diretor-presidente do Energia Sustentável, consórcio responsável pelo empreendimento, Victor Paranhos, afirmou que a paralisação pode comprometer a entrega da usina no prazo previsto de março de 2012. O consórcio é formado por GDF Suez (50,1%), Eletrosul (20%), Chesf (20%) e pela empreiteira Camargo Corrêa (9,9%).

O conflito provocou um verdadeiro êxodo de 22 mil trabalhadores (19 mil da Camargo Correa e três mil terceirizados) fugindo do canteiro. Ao longo da BR 364, que chegou a ser fechada pelos trabalhadores, dezenas de operários com malas nas costas tentavam deixar o local. A situação piorou com a convocação de trabalhadores que, na véspera, haviam saído para voltarem ao trabalho:

- Saímos da margem esquerda, porque disseram que iriam incendiar os nossos alojamentos. Fomos alojados na margem direita e, no meio da noite, veio o fogo. Não deu tempo nem de pegar os documentos. Saí com a roupa do corpo. A polícia lançou spray de pimenta - contou um trabalhador, em Jaci-Paraná, próximo de Jirau.

Os trabalhadores reclamam que o pagamento de horas extras está sendo cortado pela Camargo Correa. E reivindicam também o aumento do valor da cesta básica dos atuais R$110 para R$350, igualando o montante ao de outras empresas que atuam na obra.

No fim da tarde de ontem, havia mais de 4 mil trabalhadores no município de Jaci-Paraná e cerca de 2 mil em Nova Mutum. Eles estavam sem comida desde a manhã, porque o refeitório foi destruído durante as manifestações, informação que foi negada pela Camargo Correa. Os operários andaram mais de 12 km tentando fugir de Jirau.

A empreiteira informou que providenciou 50 ônibus para levar os 19 mil trabalhadores do canteiro de obras para a capital de Rondônia, Porto Velho, que fica a 130 quilômetros de Jirau. Segundo a Camargo Corrêa, em Porto Velho, os trabalhadores ficarão alojados num local com capacidade para 10 mil pessoas. A empresa também liberou uma linha telefônica para dar informações aos trabalhadores e seus parentes: 0800 9400810.

Em Rondônia, o gerente de Relações Trabalhistas e Sindicais da empresa, Roberto Silva, disse que as queixas dos trabalhadores sobre a truculência de encarregados, seguranças e motoristas são questões pontuais:


- Mas nós vamos apurar.

Silva disse que a empresa não tinha conhecimento de nenhuma reivindicação dos trabalhadores. E afirmou que todos os direitos trabalhistas dos operários serão preservados. Ele informou que ainda não há data prevista para a retomada as obras.

Em nota, a Camargo Corrêa afirmou que "esses atos de violência foram provocados pela ação criminosa e isolada de um grupo de vândalos". A empresa disse que é improcedente a informação de que reivindicações trabalhistas provocaram o incidente e que não recebeu dos trabalhadores qualquer solicitação dessa natureza.

O Palácio do Planalto mobilizou ontem três órgãos para manter conversas com trabalhadores, movimentos sociais, empresas e governos locais. A ordem é acompanhar de perto a situação em Jirau. O ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, conversou com o governador Moura e representantes da construtora Camargo Corrêa e da Tractebel, sócias da hidrelétrica. O Gabinete de Segurança Institucional passou a monitorar as ocorrências e o Exército entrou em prontidão. O ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência, discutiu o assunto com prefeitos, sindicato regional da construção civil, Movimento dos Atingidos por Barragens e Via Campesina.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) informou que não tem como interferir no conflito em Jirau. A autarquia argumenta que trata-se de um problema trabalhista e sua competência restringe-se a fiscalizar as obras. O Ministério do Trabalho não respondeu ao pedido de informação do GLOBO.”

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