"A responsabilidade dos sócios da empresa pela satisfação de parcelas devidas a ex-empregado pode ser definida na fase inicial do processo. Com esse entendimento, a 4ª Turma do TRT-MG modificou a sentença que havia indeferido o pedido para que os sócios da empregadora também respondessem pelo pagamento das verbas trabalhistas reconhecidas ao trabalhador. Para o juiz de 1º Grau, os sócios só poderiam vir a ser responsabilizados em caso de comprovação da inidoneidade das pessoas jurídicas. Isto ao fundamento de que as pessoas físicas dos sócios não se confundem com a personalidade jurídica das empresas. Mas o relator do recurso apresentado pelo reclamante, desembargador Júlio Bernardo do Carmo, pensa diferente.
A primeira etapa do processo, chamada de fase de conhecimento, destina-se ao conhecimento, pelo juiz, das questões controvertidas que ele terá que apreciar e julgar. É quando são ouvidas as testemunhas e coletadas as provas que irão embasar a decisão. Após o transito em julgado da decisão, passa-se à fase de execução, quando se irá buscar a satisfação material do direito reconhecido na fase de conhecimento. Para tanto, são tomadas algumas providências pelo juiz, tais como penhora, arresto, arrematação etc. No caso analisado, o relator esclareceu que os sócios não precisam participar da fase de conhecimento para virem a sofrer os efeitos da execução movida por um ex-empregado. Isto ocorrerá caso não haja indicação de bens à penhora pela sociedade devedora no prazo assinalado no artigo 880 da CLT (48 horas, contados da citação) e a não localização de bens passíveis de penhora. Mas o ex-empregado pode perfeitamente incluir os sócios na reclamação trabalhista, desde o início dela.
A situação, segundo o relator, não implica antecipação indevida da desconsideração da personalidade jurídica (pela qual os sócios passam a responder com seu patrimônio pessoal pelos débitos contraídos pela sociedade, em caso de inadimplência desta). Apenas opta-se por definir previamente a responsabilidade dos sócios. Uma medida útil, no entendimento do magistrado, na medida em que evita discussões na fase de execução e dispensa o sócio da obrigação de garantir o juízo para produzir sua defesa. Além disso, previne a fraude à execução, já que esta é considerada quando o devedor aliena os bens que integram o seu patrimônio, ao tempo em que já existia demanda contra a sua pessoa, capaz de reduzi-lo à insolvência (artigo 593, II, do CPC).
Em seu voto, o julgador fez uma análise detida das situações em que o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor autorizam atribuir aos sócios a responsabilidade pelas obrigações da sociedade. Na sua visão, especificamente os artigos 50 do Código Civil e 28 do Código de Defesa do Consumidor podem ser aplicados ao direito processual do trabalho, conforme autorizado nos artigos 8º e 769 da CLT. "A desconsideração da personalidade jurídica constitui valioso facilitador da satisfação dos créditos decorrentes da relação de emprego", justificou.
E não apenas isso. O próprio direito do trabalho respalda o entendimento. É que os artigos 2º, parágrafo 2º, 10, 448 e 455 da CLT operam a despersonalização das obrigações decorrentes da relação de emprego e indicam que todos aqueles que se beneficiam do trabalho humano devem responder pela satisfação dos créditos que dele resultam para o trabalhador. Nessa linha de raciocínio, o relator ressaltou que se o empreendimento fracassa, os sócios são chamados a responder com o próprio patrimônio. Se os sócios se beneficiaram dos lucros da sociedade e do trabalho de seus empregados, devem também arcar com os ônus do fracasso do negócio. Para o julgador, entender diferente seria transferir para o trabalhador os riscos do empreendimento econômico, o que não se admite.
O relator se valeu ainda do princípio da proteção do trabalhador, que orienta o Direito do Trabalho, para afirmar que a responsabilidade dos sócios pode inclusive ultrapassar os limites impostos pelos artigos 50 do Código Civil e 28 do Código de Defesa do Consumidor quando a relação for de emprego. Ele chamou a atenção para o dever do juiz de tornar efetivo o direito reconhecido ao trabalhador em título executivo, responsabilizando todos aqueles que se beneficiariam dos seus serviços. E esclareceu: no conflito entre a norma que distingue a sociedade da pessoa de seus sócios e as normas que asseguram e garantem direitos aos trabalhadores, deve-se adotar aquela que resulta na melhoria da condição social dos trabalhadores (caput do artigo 7º da Constituição Federal).
"O véu da personalidade jurídica deixa de ser impenetrável, em especial quando se trata de satisfazer o direito que decorre da relação de emprego, diante de sua natureza predominantemente alimentar", destacou no voto. Com essas considerações, o relator deu provimento parcial ao recurso ordinário interposto pelo reclamante para reconhecer a legitimidade dos sócios da ré para figurar na ação, bem como a responsabilidade destes pelo pagamento dos créditos devidos ao trabalhador."
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