"O seminário realizado nesta sexta, 19 de outubro, na sede do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), em Belo Horizonte, sobre as tendências e perspectivas do Direito do Trabalho, foi marcado pela proposta de aplicação dos princípios da progressividade e da vedação do retrocesso como limites materiais dos acordos e convenções coletivas de trabalho, bem como por duras críticas ao sacrifício de direitos sociais como meio de contenção das crises do capitalismo e à imposição "na marra" da terceirização; pela defesa da proteção da mais ampla liberdade de atuação dos sindicatos, e pela defesa da PEC Peluso, por parte do professor Antônio Álvares da Silva.
Abrindo o ciclo de palestras, a professora Carolina Pereira Lins Mesquita propôs, por intermédio da Teoria Geral do Direito do Trabalho, a aplicação dos princípios da progressividade e da vedação do retrocesso como limites materiais dos acordos e convenções coletivas de trabalho. Ela assegurou que os instrumentos coletivos de trabalho tem contemplado a flexibilização de direitos mínimos dos trabalhadores, como a jornada de oito horas, o limite de 44 horas semanais de trabalho e a duração e o fluir contínuo do intervalo intrajornada. Carolina lembrou do não pagamento dos cinco minutos anteriores e posteriores à jornada, que teria sido negociado e firmado em instrumentos coletivos, validados pela Justiça, e que depois virou lei, apesar da jornada constitucional ser de 8 horas. O mais grave ainda, segundo ela, é que, em se tratando de direito dos trabalhadores, não tem havido respeito às conquistas obtidas em negociações anteriores, sendo comum, por exemplo, a supressão de benefícios como cesta básica e plano de saúde.
Retrocesso social
"A pessoa não pode ser equiparada a coisas nem esquecida quanto às suas proteções", afirmou a também professora Daniela Muradas em sua exposição sobre Dignidade humana e sacrifício de direitos sociais: notas sobre o princípio da proporcionalidade e não retrocesso social. Para ela, no entanto, isso tem acontecido em países como Grécia, Portugal, Itália e Espanha, que adotaram medidas graves de retrocesso dos direitos sociais como meio de enfrentamento da crise econômica européia iniciada em 2008. Daniela reconheceu que o princípio da vedação do retrocesso, recepcionado no ordenamento jurídico da maioria dos países, tem limites, mas em situações excepcionais, de curta duração. Além disso, o fim há de ser legítimo e o meio eleito o mais adequado para a finalidade. De acordo com seu entendimento, no caso dos países europeus, o fim seria legítimo - combate à crise -, mas o meio - restrição de direitos e garantias - foi inadequado para atingir a finalidade, pois causa sacrifícios e provoca a recessão. No Brasil, pela pujante economia que se noticia, segundo a professora não poderia sequer admitir retrocesso social, seja por meio de legislação, decisões judiciais ou negociações coletivas. Entretanto, no seu entender, ele se configura na instituição da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, pela quebra de igualdade que vai acarretar entre os profissionais que trabalham nos hospitais universitários, uma vez que a empresa foi criada com o objetivo de resolver problemas de contratação de trabalhadores para esses hospitais, pelo regime da CLT.
Terceirização
A advogada e professora Ellen Mara Ferraz Hazan, ao discorrer sobre terceirização e enquadramento sindical, criticou duramente a Súmula 331 do TST, dizendo que, ao admitir a terceirização interna, fora das hipóteses previstas expressamente em leis, ela admite o tráfico de pessoas, porque o fornecimento de mão-de-obra tem preço, e o que tem preço deixa de ter dignidade. Para ela, a terceirização é um instituto ilegal (salvo nos casos expressamente previstos em leis), ilegítimo, desproporcional e agressivo ao princípio do não retrocesso social, que vem sendo imposta na "marra" pelo poder econômico. Depois de afirmar que nossa Constituição Federal está sendo jogada no lixo, ela lembrou que os operadores do direito juram defender a Constituição e não o poder econômico. De acordo com seu entendimento, a terceirização fragmenta o movimento sindical, estabelece a possibilidade de mudança da representação sindical e, com isso, reduz a força dos sindicatos. Quanto aos trabalhadores, promove a quebra da isonomia salarial e estabelece anormal competitividade entre os empregados da empresa tomadora e os terceirizados, estes com sentimento de injustiça por terem menos benefícios que aqueles, querendo mostrar serviço além da conta para, quem sabe, serem contratados diretamente, mas provocando na empresa tomadora o desejo de desfazer dos seus quadros para ter apenas os terceirizados, mais baratos e teoricamente mais produtivos. Sobre o enquadramento sindical, ela questiona a opção pela atividade preponderante da empresa tomadora dos serviços, ao argumento de que não é plausível no caso de rotatividade de empresas, situação em que a cada dia o trabalhador teria enquadramento diferente. Para ela, ao falar de organização sindical, o inciso II do artigo 8º da Constituição Federal não se refere a sindicato, mas a federação, daí porque é possível a pluralidade sindical, amparada na Convenção 87 da OIT, organização da qual o Brasil é membro integrante.
Atos antissindicais
Por meio da história do movimento sindical, a professora Maria Rosaria Barbato mostrou que o direito do Trabalho foi conquistado a partir do surgimento e atuação dos sindicatos, em razão do que, para ela, a proteção à liberdade de atuação dos sindicatos representa a proteção do próprio Direito. Ela lembrou a greve dos petroleiros de 1995, fortemente reprimida, quando o TST aplicou multas impagáveis ao sindicato, provando a posterior condenação do Brasil pelo Comitê de Liberdade Sindical da OIT. Apesar de ser favorável ao pluralismo sindical, Rosaria Barbato não credita a crise do sindicalismo brasileiro à unicidade, até porque, segundo ela, também nos países em que vigora o pluralismo os sindicatos estão fracos, como na Itália. Ela defendeu que o papel do juiz seja de admitir a mais ampla liberdade sindical, que não tem sido garantida mundo a fora, pois são mais de 2900 queixas na OIT. A professora também questionou o direito individual de não participar da greve, ao argumento de que o individual não deve sobrepor o coletivo. Como agentes passivos dos atos antissindicais ela apontou o sindicato, o dirigente, a categoria, e como agentes ativos, o Estado, por meio do Legislativo, Executivo e o Judiciário; os consumidores e a mídia. Para a palestrante, o Judiciário encontra subsídios na Constituição Federal, na Convenção 87 da OIT e na CLT para coibir atos contra as atividades sindicais.
PEC Peluso
Para o professor Antônio Álvares da Silva a PEC Peluso é tão boa que resolve o problema do Judiciário com apenas dois artigos. Com sua aprovação e vigência, o trânsito em julgado se dará com a decisão de segundo grau, proferida em 120 dias no TRT Mineiro, prazo que pode ser reduzido para apenas 90 dias. "A parte não fica esperando o julgamento de recursos jurídicos pelas instâncias superiores por quatro, cinco, seis anos, mesmo porque a matéria jurídica não é de interesse dela, mas sim do Estado", explicou o desembargador, que sugere, para não ser necessário o ajuizamento de ação rescisória no caso de reforma, emissão de ofício pelo tribunal superior ao tribunal inferior dando notícia de que a sentença foi revogada. Ele explicou que em tal hipótese o empregador não será prejudicado, pois haveria um fundo (FUGIT) para seu reembolso. Na sua visão, o trabalhador recebendo rapidamente seus direitos, o demandismo será diminuído, pois o empregador não se sentirá estimulado a sonegá-los. O professor encerrou sua palestra ensinando que "o Direito que não tem vigência é apenas um discurso", e afirmando que a PEC tem chances de ser aprovada, se o povo quiser, apesar de contrariar alguns interesses.
O seminário marcou também o lançamento dos livros Direito do Trabalho: Tendências e Perspectivas (RTM Editora), organizado pela professora Carolina Pereira Lins Mesquita, autora da obra, também lançada, Teoria Geral do Direito do Trabalho: pela progressividade sociojurídica do trabalhador (LTr Editora), e A PEC dos Recursos e a reforma do Judiciário: defesa da proposta do Ministro Peluso e Honorários Advocatícios obrigacionais (RTM Editora), ambos do desembargador aposentado, professor Antônio Álvares da Silva.
Os trabalhos foram presididos pelo desembargador Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto, conselheiro da Escola Judicial do TRT da 3ª Região, representando o diretor desta, desembargador 2º vice-presidente e ouvidor do Tribunal, Luiz Otávio Linhares Renault.
O evento foi promovido pela referida escola e pela Biblioteca Juiz Cândido Gomes de Freitas, no âmbito do Projeto Leis & Letras, com patrocínio da Amatra3, cuja presidente, juíza Jacqueline Prado Casagrande esteve na composição da mesa. Magistrados, servidores, advogados e estudantes lotaram o auditório."
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