"Cerca de três milhões de pessoas trabalham no país em época de campanha eleitoral, entre jornalistas, pesquisadores, motoristas, cabos eleitorais, telefonistas, copeiras e outros profissionais das mais diversas áreas, revela o analista político Gaudencio Torquato. "A eleição mobiliza diversas atividades formais e informais, envolvendo de 15 a 20 setores da economia."
Mesmo envolvendo cifras milionárias, a campanha política é, na visão dos profissionais da área, uma atividade de risco. "Os contratos são de boca e não existe garantia de que receberemos nossos salários. Muitas vezes os candidatos terminam as eleições sem nos pagar", conta Paulo (nome fictício), radialista que já trabalhou em campanhas de grandes partidos.
Embora esses profissionais cheguem a ganhar muito mais durante a campanha do que receberiam em outras épocas do ano, o artigo 100 do Código Eleitoral (Lei nº 9.504/1997) dispõe que esse tipo de atividade não gera vínculo, ficando os direitos do trabalhador condicionados a contratos de prestação de serviço.
Proteção
Em um cenário de grandes desigualdades – que passa pelo marqueteiro que cobra milhões por uma campanha, e chega ao distribuidor de panfletos que muitas vezes recebe apenas um lanche -, os advogados alertam que a parte mais frágil nesse tipo de prestação de serviço deve estar ciente das normas – trabalhistas e eleitorais - que regem as contratações no período.
"A corrente majoritária, nesses casos, é no sentido de que não há vínculo de emprego, porque a campanha eleitoral tem cunho ideológico", explica a advogada Cíntia Fernandes. A inexistência da relação de emprego, porém, não significa que o prestador não esteja protegido pela legislação. Ele pode não ter amparo em relação a verbas trabalhistas, como férias e 13º Salário, mas há decisões que equiparam esse tipo de prestação de serviços ao trabalho eventual ou temporário, com direito a remuneração.
A maneira do trabalhador se resguardar de um eventual "calote" por parte do contratante, segundo ela, é firmar um contrato de natureza cível, estipulando a remuneração, as tarefas contratadas, a duração da prestação e outros aspectos.
Há, também, questões relativas à saúde e à integridade física do trabalhador. "Várias determinações devem ser cumpridas, havendo ou não vínculo", assinala outra advogada, Rosania de Lima Costa. Os homens-placa e panfleteiros, por exemplo, que ficam ao ar livre, têm de contar com medidas de proteção à saúde, como a ingestão de líquidos, o uso de banheiros e o descanso. "Cabe ao partido ou comitê definir uma forma de trabalho que respeite a saúde e a integridade física de seus contratados", ressalta.
Calote
Nas eleições, é comum o comitê de campanha contratar uma empresa de marketing político para coordenar os trabalhos. Essa empresa subcontrata outras empresas ou profissionais - como produtoras, institutos de pesquisas, assessoria de imprensa, telemarkting, etc. Os subcontratados podem também arregimentar seus próprios empregados.
De acordo com Gaudencio Torquato, os problemas trabalhistas geralmente ocorrem quando os partidos deixam de pagar as empresas contratadas. Situação que não é difícil de acontecer. "Em muitas campanhas, só recebi a primeira parte do contrato", revela. Uma apresentadora de TV, que não quis revelar o nome, passou seis meses para receber de um candidato, depois de muita cobrança.
Justiça do Trabalho
A Justiça do Trabalho tem julgado diversos pedidos de vínculo de emprego que acabam não sendo reconhecidos. A situação que prevalece é a configuração de relação de trabalho, o que não gera o direito a verbas como férias, 13º salário e outros benefícios garantidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Mas mesmo não havendo o vínculo de emprego, com assinatura da carteira de trabalho, os prestadores de serviço têm sua integridade física assegurada bem como o direito à remuneração, entre outros. Até mesmo indenizações por dano moral podem ser pleiteadas quando necessário.
O ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz foi processado por um cabo eleitoral que ficou cego do olho esquerdo durante uma briga com adversários políticos nas eleições de 1998. O caso chegou ao Tribunal Superior do Trabalho e foi apreciado pela Terceira Turma, sob relatoria da ministra Rosa Weber, hoje ministra do Supremo Tribunal Federal."
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