quarta-feira, 11 de maio de 2011

“Redução nos desembolsos do BNDES” (Fonte: Valor Econômico)


“Cristiano Romero

O BNDES liberou R$ 24,9 bilhões em operações de crédito no primeiro trimestre. O valor foi apenas 2% inferior ao do mesmo período do ano passado. Apesar disso, o banco estima que, em 2011, fará desembolso total de R$ 145 bilhões, cerca de 14% abaixo do resultado de 2010, recorde histórico (ver gráfico abaixo).
A queda no total dos desembolsos tem relação direta com a Petrobras, que em 2009 tomou R$ 25 bilhões emprestados e, em 2010, mais R$ 24,8 bilhões. Sem a estatal, o volume de crédito a ser concedido pelo banco este ano será o mesmo último ano. Trata-se, ainda assim, de uma soma expressiva de recursos.
Integrantes do governo, como o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, e o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, defenderam recentemente moderação na oferta de crédito subsidiado por parte dos bancos públicos. No caso do BNDES, as liberações cresceram 82,6% entre 2008 e 2010, sob a justificativa da crise financeira internacional.
É inegável o papel anticíclico que o BNDES cumpriu em 2009, no auge da turbulência. Como a economia acelerou o crescimento já na segunda metade daquele ano, tornou-se imperativo manter o banco atendendo à demanda das empresas por financiamento de longo prazo no momento seguinte - o banco oficial é, praticamente, a única fonte de crédito dessa modalidade no país. O problema, talvez, tenha sido a dose, afinal, em 2010, o mercado de capitais já havia retornado à normalidade. O governo reconhece que, agora, é hora de estabilizar os desembolsos e abrir espaço para o mercado fazer a sua parte.
"O governo viu que não era eficiente seguir na trajetória de usar o BNDES como único e exclusivo financiador de longo prazo e que se tornaria ineficiente, também, do ponto de vista de gestão do banco", explicou a esta coluna o diretor de Planejamento do banco, João Carlos Ferraz. "Um país que tem um horizonte de investimento como o brasileiro deveria naturalmente atrair a indústria financeira para o longo prazo."
Esse é, sem dúvida, um grande desafio. O mercado de capitais cresceu nos últimos anos, mas ainda há inúmeras deficiências a serem superadas. Os bancos não se sentem encorajados a conceder crédito de longo prazo. O mercado de debêntures é incipiente. Os mercados secundários não funcionam.
O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, é curiosamente a autoridade mais interessada em atrair a chamada indústria financeira para as operações de longo prazo. Quer, com isso, diminuir a dependência das empresas dos recursos do banco. No ano passado, Coutinho trabalhou, a partir de consultas com representantes do mercado financeiro, na formulação de medidas para estimular a oferta de instrumentos financeiros de prazos mais longos. As primeiras iniciativas foram anunciadas em dezembro.
Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que, de janeiro a abril, as empresas captaram R$ 38,4 bilhões no mercado doméstico, 5,2% abaixo do que fizeram no primeiro quadrimestre de 2010. Ironicamente, as captações via debêntures, um dos principais alvos das medidas do governo, foram as que mais recuaram (37,1%).
Apesar disso, há indícios, segundo Ferraz, "de que o mercado está vindo". A própria estabilidade nos desembolsos do BNDES no primeiro trimestre indicaria isso. Para diminuir a oferta de crédito, o banco reduziu em março, de 100% para 90%, a sua participação máxima nos empréstimos. "Apenas essa medida cria um espaço de R$ 15 bilhões para o mercado ocupar", observou.
O percentual máximo foi mantido apenas para projetos dos setores considerados prioritários (inovação, micro e pequenas empresas, obras de infraestrutura do PAC). Além disso, o BNDES estabeleceu que, quando entrar com 90% dos recursos, 20% do total será emprestado a juros mais altos. Paralelamente, está induzindo as empresas a, em vez de tomar crédito direto, lançar debêntures que podem ser compradas pelo banco. O objetivo é ajudar a desenvolver o mercado secundário desses papéis.
Ferraz acredita que o Brasil vive, no pós-crise, desafios "mais complexos", que obrigam o país a pensar no adensamento das cadeias produtivas, no aumento da qualidade dos produtos, na manutenção e expansão do ritmo de investimento em infraestrutura e na busca por inovação.
"Os Estados Unidos viraram uma economia liderada pelas exportações. Para sair dos déficits gêmeos [fiscal e externo], estão usando o poder da moeda deles. As exportações foram responsáveis por 2/3 do crescimento americano no ano passado [antes, esse papel cabia ao consumo das famílias]. Há o fator China e o Brasil, sendo atrativo, tem o problema da [apreciação da] moeda", argumentou o diretor do BNDES. "Os desafios de competitividade estão começando a se revelar de uma maneira muito extremada, relativamente ao que ocorria dois anos atrás."
O governo Dilma pretende encarar esses desafios com a edição de uma nova versão da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), tarefa liderada pelo ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel. "Todo o mundo está oferecendo condições de financiamento para a nata da sua indústria de maneira muito agressiva. Estamos muito preocupados com isso", diz Ferraz.

Cristiano Romero é editor-executivo e escreve às quartas-feiras.”


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