"Autor(es): Por Juliano Basile e Maíra Magro | De Brasília
Valor Econômico - 01/02/2012
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar hoje, em sua primeira sessão do ano, o processo que discute a competência do Conselho Federal de Justiça (CNJ) para investigar juízes acusados de irregularidades. O assunto criou uma divisão no Judiciário, com associações de magistrados defendendo limites à atuação do Conselho. Também colocou em lados opostos o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, e a corregedora Nacional de Justiça, Eliana Calmon.
No Supremo, o placar também está dividido. Manifestações prévias dos ministros e liminares concedidas antes do julgamento permitem identificar duas correntes de pensamento distintas sobre o CNJ. Cada uma delas teria pelo menos cinco votos.
A primeira corrente defende que o CNJ só pode investigar magistrados depois de esgotada a atuação das corregedorias dos tribunais dos Estados. Essa corrente tem fortes defensores, como o ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo que será julgado hoje - uma ação da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) contra a resolução do CNJ que disciplinou os procedimentos de investigações. Para o ministro, o CNJ só pode agir depois que os tribunais apurarem o caso.
O presidente do STF, Cezar Peluso, é outro defensor da tese de que a competência do CNJ é subsidiária aos tribunais. Para o ministro, se o CNJ começar a instaurar processos em todos os casos de juízes suspeitos que lhe chegam, as corregedorias dos tribunais dos Estados não teriam mais razões para funcionar. Além de Peluso e Marco Aurélio, os ministros Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Luiz Fux deram indicações de que são favoráveis à competência subsidiária.
Já a segunda corrente entende que o CNJ tem o poder de investigar juízes diretamente, caso os tribunais locais não mostrem disposição para fazê-lo. Segundo essa tese, a competência do CNJ é concorrente com a dos tribunais. Assim, a Corregedoria Nacional de Justiça, vinculada ao CNJ, não precisaria aguardar o resultado de apurações demoradas nas corregedorias das Cortes locais. Nessa segunda corrente estariam os ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia Antunes Rocha, José Antonio Dias Toffoli, Joaquim Barbosa e Carlos Ayres Britto.
Consultado a respeito da expectativa para o julgamento de hoje, um dos ministros integrantes dessa segunda corrente afirmou que "não dá para passar a tese da subsidiariedade absoluta". Segundo ele, é necessário determinar algumas condições para que o CNJ possa agir, quebrando a inércia de tribunais que não investigam os seus juízes.
"Eu espero que haja o pregão", afirmou ao Valor o ministro Marco Aurélio Mello, referindo-se à possibilidade de o julgamento ser realizado hoje. Ele lembrou que liberou o caso para o plenário em 5 de setembro, mas o tema entrou 13 vezes na pauta sem que fosse votado. "O fato de ter entrado anteriormente [na pauta] e não ter havido a leitura foi péssimo", avaliou Marco Aurélio. "Poderiam ter evitado esse desgaste todo", completou.
Uma vez confirmada essa divisão, o desempate pode acontecer de duas formas. A primeira seria pelo voto da ministra Rosa Weber. Ela tomou posse em dezembro, mas ainda não participou de nenhuma sessão no Supremo. Vinda do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Rosa não atuou em casos envolvendo o CNJ e, por isso, é difícil prever seu voto. Procurada, a ministra não atendeu aos pedidos de entrevista e evitou antecipar qual será sua posição no julgamento.
A segunda forma de desempate seria por meio da solução mais próxima a um consenso. Isso já aconteceu em outros casos polêmicos, como, por exemplo, o julgamento de pesquisas com células-tronco. Naquela ocasião, também havia duas correntes: uma favorável às pesquisas e outra que pretendia impor restrições. Ao fim, o STF decidiu que as pesquisas podem ser realizadas, desde que seguidas de uma série de condições estipuladas pelo tribunal. Com isso, nenhuma corrente obteve vitória absoluta, mas o tribunal concluiu o caso com uma decisão que não causou grandes antagonismos entre os ministros.
Ontem, procurador-geral da República, Roberto Gurgel, determinou o arquivamento de um pedido de investigação criminal contra a corregedora-nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon. Ela foi acusada pela AMB de violar o sigilo das contas salariais de juízes que movimentaram mais de R$ 500 mil por mês em suas contas. Segundo Gurgel, Eliana recebeu informações genéricas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre as contas, sem revelar o nome de nenhum juiz. "Os dados do Coaf não contêm a identificação dos magistrados e servidores que eventualmente realizaram operações qualificadas como atípicas", disse Gurgel.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) organizou um ato público, ontem, para defender os poderes de investigação do conselho. "O CNJ precisa ter competência concorrente para investigar os que não honram a toga da Justiça brasileira", disse o presidente da OAB, Ophir Cavalcante."
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