"Submeter alguém à condição análoga de escravo é crime, segundo o artigo 149 do Código Penal. Apesar da previsão em lei, Wilson Ferreira da Rocha, fazendeiro do Pará, foi absolvido pela Justiça Federal em 2009, mesmo após fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) constatar que os trabalhadores na propriedade do acusado estavam sendo impedidos de se locomover, por conta de dívidas e trabalhando em condições degradantes e insalubres.
O fato, constatado pelo MTE entre 28 de abril e 9 de maio de 2003, aconteceu antes da entrada em vigor da lei 10.803/03, que deu nova redação ao art. 149 do Código Penal. O Código prevê que é crime reduzir alguém a condição análoga à de escravo, já a lei 10.803, acrescentou condutas que se enquadram nesse tipo penal, como sujeitar alguém a condições degradantes de trabalho ou restringir a locomoção de trabalhador em razão de dívida com o empregador.
O juiz federal, apesar de ter registrado as condições degradantes a que eram submetidos os trabalhadores, considerou que Wilson não poderia ser condenado com base em uma lei posterior ao suposto cometimento do crime e que deveria responder de acordo com a redação original do Código, que não traz especificações de conduta. O Ministério Público Federal recorreu da decisão ao Tribunal Regional Federal da 1ª região (TRF1).
Segundo o MPF, a lei 10.803/03 não criou uma nova conduta, apenas exemplificou os meios pelos quais se pode reduzir alguém à condição análoga a de escravo. No recurso, alegou que submeter alguém a condições degradantes/insalubres encaixa-se no crime previsto pelo art. 149 do CP, quer na redação conferida pela Lei 10.803/03, quer na original.
Em parecer, o procurador regional da República Juliano Baiocchi pediu a condenação do fazendeiro. “Reduzir alguém a condição análoga a de escravo, é diminuir, até mesmo suprimir, a imagem que a vítima tem de si. É lesão direta ao núcleo fundamental da Constituição Federal”, afirmou.
A 4ª turma do TRF1 acatou o parecer do MPF, por acreditar que a Lei 10.803/03 não criou conduta incriminadora, mas apenas conferiu nova redação ao dispositivo que já repudiava criminalmente a prática de redução de trabalhadores a condição análoga à de escravos. A decisão, da qual não cabe mais recurso, abre um precedente para o julgamento de casos semelhantes que tramitam na Justiça Federal."
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