por Mariana Haubert | 04/05/2012 07:00
O projeto relatado por Zarattini impedirá que empresas empurrem para seus funcionários responsabilidade por atos de corrupção
Empresas envolvidas em denúncias de corrupção ou que estejam sendo investigadas por cometer crimes contra a administração pública terão mais motivos para se preocupar, caso a Câmara dos Deputados aprove a chamada Lei Anticorrupção. O projeto de lei 6.826, de 2010, estabelece a responsabilização administrativa e civil de empresas e seus diretores pela prática de atos ilícitos contra a administração pública nacional ou estrangeira. O projeto de lei, editado pelo Poder Executivo, tramita em caráter conclusivo e a previsão é que seja votado na comissão especial em que se encontra na Câmara, no próximo dia 23 de maio. Caso seja aprovado, e não haja requerimento para votação em plenário, seguirá para o Senado.
Na prática, o projeto institui a responsabilidade objetiva das empresas. Atualmente, em casos de corrupção, é preciso que se comprove que a organização enviou alguém para corromper a administração pública. Em muitos casos, quando flagradas, as empresas argumentam que o enviado agia por conta própria, sem autorização, e se livra, assim, de responsabilidade.
Segundo o relator do projeto na Câmara, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), a possibilidade de empurrar a responsabilidade para o funcionário que participou da negociação deixar de existir. O texto da lei estabelece que agora a responsabilização será de quem foi o beneficiário dos atos de corrupção. Ou seja, as empresas. "As empresas sempre acusam seus funcionários e dizem que aquilo que foi praticado é de responsabilidade do funcionário, ou os diretores e presidentes dizem que não sabiam. Mas agora se observará quem recebeu o benefício, ou seja, a empresa corruptora poderá ser punida e não apenas seus diretores, presidentes, acionistas ou qualquer pessoa física que possa responder pelos crimes", explicou o deputando em entrevista ao Congresso em Foco.
Se, por exemplo, o texto já estivesse em vigor, a Delta Construções S.A., acusada de envolvimento com os negócios ilegais do contraventor Carlinhos Cachoeira, poderia ser punida, e não apenas os seus diretores. Num caso em que ficasse comprovado que, mediante o pagamento de propina, a empresa conquistou algum contrato de obra pública, poderia se dar a responsabilização. Na quarta-feira passada (25), Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta, foi detido em Goiânia e está preso no presídio da Papuda, em Brasília. Ele foi afastado do cargo após a revelação de ter ligações com o bicheiro Carlinhos Cachoeira durante a Operação Saint-Michel, segundo o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Abreu é suspeito de corrupção e formação de quadrilha.
Multas e suspensão
De acordo com a legislação vigente, a única pena prevista para empresas corruptoras é a aplicação da declaração de inidoneidade, que impede que instituições nesta situação participem de novos contratos ou licitações. Se aprovada, a nova lei estabelece formas de punição, com multas de até 20% do faturamento bruto da empresa, declaração de inidoneidade por até cinco anos e a suspensão do funcionamento da empresa e algumas outras penas aplicáveis pelo próprio Poder Executivo.
Para Zarattini, o país tem experimentado um período de transformação nas formas de fazer política e também de fazer negócios "que tem uma relação direta com o combate à corrupção". "Existe uma clara decisão da sociedade – manifesta, por exemplo, em processos de "impeachment", em cassação de mandatos e em legislações como a Lei da Ficha Limpa –, de romper com o círculo vicioso da corrupção e adotar um estilo de governo e de negócios orientado pela transparência", afirma o deputado em seu relatório.
Zarattini também afirma que a punição deve ocorrer dentro de parâmetros legais e no menor prazo possível. O deputado explica que "somente assim ficará claro para toda a sociedade que as regras do jogo mudaram, de uma vez por todas, e que os responsáveis por atos lesivos à administração pública, pessoas jurídicas ou pessoas físicas, serão processados e punidos, conforme a lei, de forma rápida e eficaz".
Acordos internacionais
A aprovação da lei anticorrupção faz parte de uma série de ações que o governo brasileiro está obrigado a adotar para atender a acordos internacionais antisuborno e anticorrupção ratificados pelo país. O Brasil acompanha a Irlanda e a Argentina no grupo de países com legislação considerada deficitária sobre o tema. Apesar de já ter a Lei de Licitações (8.666/1993) e a Lei Antitruste (8.884/1994), o país precisa ter aprovada a sua Lei contra Atos da Administração Pública para ingressar no grupo de países com leis rigorosas contra a corrupção.
A lei protege ainda os princípios constitucionais de liberdade de iniciativa, da livre concorrência, da função social da propriedade, da defesa dos consumidores e dos contribuintes a partir de regras de prevenção e de repressão à concorrência desleal, à infração ou abuso de poder econômico que atentem contra as estruturas de mercado.
Em setembro do ano passado, uma comissão especial foi criada para votar o tema, mas somente na última semana foi apresentado o relatório final. Na ocasião, o deputado Alberto Filho (PMDB-MA) pediu vista e a votação foi adiada para o fim do mês.
Embora a intenção seja aprovar rapidamente o projeto, há ainda um risco de retardamento. Caso 10% dos deputados assinem um requerimento nesse sentido, o projeto terá que passar pelo plenário da Câmara antes de seguir para o Senado. "Temos voto para aprovar o projeto na comissão e enviar diretamente ao Senado, mas estamos conversando com vários deputados para evitar que o texto siga antes para o Plenário da Câmara, pois sabemos que sua votação lá pode demorar meses, havendo até o risco de ser retirado de pauta. É uma matéria importante e precisa ser aprovada, mas infelizmente, sabemos que o lobby das empresas contra o projeto é muito grande", afirmou Zarattini."
Nenhum comentário:
Postar um comentário