"Autor(es): ANA D"ANGELO
Correio Braziliense - 22/01/2012
Número de decisões judiciais favoráveis aos contribuintes que pedem a concessão de benefícios cresce até 28%. Advogados apontam sérios entraves para fazer valer mesmo os direitos mais básicos previstos na legislação
Os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conseguem, cada vez mais, receber na Justiça os benefícios negados nas agências do órgão. A quantidade de aposentadorias obtidas judicialmente pelos trabalhadores subiu 9% entre 2009 e 2011. Mas o salto maior foi nas concessões pelos tribunais de pensões por morte e dos auxílios (por doença e por acidente): o volume anual de decisões favoráveis aos trabalhadores subiu 27% e 28%, respectivamente. Os dados são de levantamento feito pelo Ministério da Previdência Social a pedido do Correio.
Tantas decisões fizeram com que a proporção das concessões de benefícios determinadas pelo Judiciário em relação ao total liberado pelo INSS retomasse um ritmo forte de alta no ano passado. No segundo semestre de 2011, as ordens judiciais para a Previdência liberar benefícios ficaram na casa dos 9% do total em média, chegando a atingir 9,4% em outubro. Antes, esse indicador variava entre 6,5% e 8,5%, conforme o mês.
Em dezembro, quando o Judiciário profere menos decisões por causa do recesso, os benefícios obtidos na Justiça representaram 8,9% do total. Em dezembro de 2010, havia ficado em 7,9%. Os principais motivos são o não reconhecimento pelo INSS de tempo de serviço reivindicado pelo segurado, rural ou urbano, e a negativa dos médicos peritos em atestar a incapacidade parcial ou total para o trabalho de quem pede auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
O Ministério da Previdência Social considera os dados preocupantes, pois a quantidade de benefícios concedidos por ordem judicial deveria diminuir e não aumentar, diante da melhora dos sistemas de informação do INSS. Especialistas em direito previdenciário sustentam que o INSS costuma negar direitos cristalinos. O advogado Wladimir Novaez Martinez cita dificuldades de conseguir aposentadoria especial para aqueles que trabalham expostos a agentes nocivos à saúde e reconhecimento de tempo de serviço, mesmo quando registrado em carteira. "O INSS sempre foi de transferir o ônus da prova para o segurado. Todo mundo reclama, mas continua do mesmo jeito", afirma.
O advogado Leandro Rufino destaca que, além da não admissão do registro de emprego em carteira que não consta no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) do governo, o que tem levado mais os trabalhadores à Justiça é a negativa de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez. "O médico que acompanha o funcionário não autoriza sua volta ao trabalho. Já a perícia do INSS diz que ele está capacitado e suspende o benefício. A empresa não pode recebê-lo, porque ele tem atestado de afastamento. Não lhe resta alternativa a não ser recorrer à Justiça", explica.
Outra demanda comum no Judiciário com alto índice de decisões favoráveis é de pensão por morte de segurado que ainda não havia se aposentado e não tinha registro em carteira. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região reconheceu, em setembro do ano passado, o direito de uma filha de trabalhadora que morreu de leucemia cinco anos depois do último vínculo empregatício. O INSS alegou que a mãe tinha perdido a qualidade de segurada pela falta de contribuição no período.
Mas os desembargadores entenderam que ela estava incapacitada para o trabalho por causa da doença. Para eles, "à época do óbito, ela ainda ostentava a condição de segurada, circunstância que legitimava a concessão de aposentadoria por invalidez, inclusive independentemente de carência (prazo mínimo de contribuição)".
Entre os problemas enfrentados pelos trabalhadores, está a discrepância entre os registros no CNIS e as anotações na carteira de trabalho dos segurados. O cadastro — base de dados que reúne informações sobre vínculo empregatício e remuneração dos empregados e contribuintes individuais — foi instituído em 1989 justamente para que o segurado não precisasse comprovar o tempo de serviço, pois as informações estariam todas registradas.
Mas o sistema é cheio de falhas, muitas por omissão das empresas que não repassam as informações corretas, principalmente por deixarem de recolher as contribuições devidas. Também é comum não constar a remuneração no CNIS ou o valor menor sobre o qual houve o desconto da contribuição previdenciária pelo empregador. No último caso, se o empregado não apresentar prova do salário real, o INSS vai considerar o registrado na carteira ou o salário mínimo.
Embora o Ministério da Previdência negue, as agências de atendimento costumam recusar o reconhecimento do período alegado pelo trabalhador, mesmo registrado em carteira, que não consta da base do CNIS. Ele é orientado a correr atrás de outros documentos, como contracheques e declaração de empresa. O advogado Leandro Rufino reforça que a carteira profissional continua sendo prova plena do tempo de serviço, e o INSS tem que aceitá-la, sem outras exigências.
"Em muitos casos, a empresa nem existe mais. A obrigação de cobrar a contribuição que não foi recolhida é do INSS, que deve reconhecer o vínculo constante da carteira e depois ir atrás do devedor", afirma.
No campo
Os estados brasileiros com maior índice de demandas judiciais e de decisões favoráveis são: São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro. Na Região Sul do país, em que a atividade agrícola ainda é muito forte, há ainda muitos processos na Justiça envolvendo o reconhecimento de tempo de atividade rural.
Documentos
Os especialistas recomendam ao trabalhador guardar desde já cópia de contrato de trabalho, contracheques e a rescisão do contrato, pelo menos, para atestar início e fim do vínculo e as remunerações. Mesmo estando longe da aposentadoria, recomenda-se também comparecer ao posto do INSS e verificar os dados que estão ou não no CNIS.
""O INSS sempre foi de transferir o ônus da prova para o segurado. Todo mundo reclama, mas continua do mesmo jeito""
Wladimir Novaez Martinez, advogado"
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