O setor bancário iniciou uma disputa judicial milionária com a Polícia Federal (PF). Instituições financeiras - como o HSBC e o Itaú - questionam multas aplicadas por descumprimento de leis e normas de segurança para as agências. Em alguns casos, já obtiveram decisões favoráveis à anulação de autuações sofridas por falta de plano de segurança aprovado, número insuficiente de vigilantes e problemas em alarme. Desde 2008, foram aplicadas 5,8 mil multas contra bancos e empresas de segurança privada, que somam cerca de R$ 55 milhões, segundo a PF.
O argumento dos bancos é de que eles não poderiam ser multados com base só em portarias da Polícia Federal. Para a defesa das instituições financeiras, essas normas extrapolariam as punições previstas na Lei Federal nº 7.102, de 1983, que trata de segurança privada. Entre as penalidades que teriam sido "criadas" por portarias estaria a possibilidade de interditar agências que funcionem sem um plano de segurança aprovado. De acordo com a Polícia Federal, desde 2008, foram aplicadas 85 multas por esse motivo.
O Itaú, no entanto, conseguiu anular uma multa sofrida em outubro de 2006, por ter deixado de apresentar requerimento de renovação de plano de segurança no prazo de 30 dias antes do vencimento. A autuação foi anulada pela 6ª Vara Cível de São Paulo. Para o juiz, as Portarias nº 387, de 2006 e nº 4410, de 2008, ao prever outras punições aos bancos, como a interdição, extrapolariam sua função. Segundo a decisão, "só a lei pode prever sanção administrativa, estando condenadas todas as penalidades oriundas de atos normativos que não se constituam em lei em sentido formal".
Uma autuação lavrada contra outra agência do Itaú pelo mesmo motivo, no valor de R$ 20 mil, também foi anulada. Em decisão de abril, a juíza Carla Rister, da 1ª Vara de São Carlos, entendeu que a Portaria nº 387, editada pela Polícia Federal, seria inconstitucional. Assim, não poderia servir de parâmetro para a aplicação de multas contra instituições financeiras.O banco HSBC também obteve recentemente duas liminares para suspender o pagamento imediato de 13 multas aplicadas, após esgotar a discussão por via administrativa. As liminares foram concedidas pelo juiz federal substituto Bruno César Bandeira Apolinário, da 3ª Vara do Distrito Federal. Ele afirmou nas suas decisões que "o Poder Judiciário já se manifestou diversas vezes contra portarias que exorbitam o poder regulamentar ao estabelecer penas não previstas em lei". Entretanto, deixa claro que deverá pedir informações sobre o tema para verificar se esse seria o caso ao analisar o mérito. Em todas as decisões, ainda cabe recurso.
Para o diretor jurídico da Febraban, Antonio Carlos de Toledo Negrão, essas punições teriam que estar previstas em lei e não apenas em portarias da Polícia Federal. Porém, essas ações judiciais ficam a cargo de cada banco. Ele afirma, no entanto, que como esses autos de infração são lavrados por agentes que visitam as agências bancárias, os critérios para se aplicar multas acabam sendo pessoais. Como a lei não prevê qual o número mínimo de vigilantes necessários ou tempo razoável para o disparo do alarme, isso dependerá da interpretação de cada agente, segundo ele. Além disso, Negrão afirma que bancos também são multados por questões que seriam de responsabilidade das empresas de vigilância. Uma instituição financeira, por exemplo, teria sido autuada porque o vigilante trabalhava sem apito.
Por meio de nota encaminhada por assessoria de imprensa, a Polícia Federal alega que a Portaria nº 387 apenas aplica a Lei nº 7.102 "sem qualquer extrapolação ou descumprimento ao princípio da legalidade". Para o órgão, embora os bancos tenham obtido algumas poucas decisões a seu favor, já haveria, em uma rápida análise, mais de dez entendimentos favoráveis à Polícia Federal. Nessas decisões, os juízes teriam considerado que a portaria mencionada só reproduz o que prevê a lei.
O advogado Fábio Ozi, sócio do Mattos Filho Advogados, afirma que a tese das instituições financeiras tem chances de prosperar no Judiciário. Isso porque há diversos precedentes nos tribunais superiores que afastam penalidades impostas em portarias de condutas que não estão previstas em lei.
Procurado pelo Valor, o advogado Eduardo Nobre, do Leite, Tosto e Barros Advogados, que representa o HSBC nas ações, não quis se manifestar. Já a assessoria de imprensa do Itaú informou que não comenta assuntos sub judice."
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