O impeachment está previsto na Constituição Federal de 1988? Sim, está. E o Supremo Tribunal Federal (STF) já não decidiu o rito do impeachment? Sim, decidiu. Então por que continuam a dizer que o impeachment da Dilma é golpe? Vejamos a questão de outro modo: o homicídio está previsto no Código Penal? Sim, está. Seu rito está previsto no Código de Processo Penal? Sim, está. Então por que eu não posso prender o Bolsonaro ou quem o apoia?
É a mesma lógica. Embora eu adorasse ver aquilo na
prisão, ao que sabemos, até o momento, ele não cometeu o ato de matar alguém –
requisito para se configurar o crime. O que ele fez foi homenagear alguém que
matou e torturou muitos. Mas aí não seria crime de homicídio, mas crime contra
a paz pública, nos termos do art. 287, CP. Em qualquer dos casos (porque eu
quero ou porque ele homenageou um torturador), não faria sentido prender ele
por homicídio, mas, no máximo, uma cusparada coletiva.
Em igual sentido, uma pessoa não pode reivindicar o
impeachment de Dilma porque não gosta dela, ou porque não gosta do PT, de pobre
ou de comunista. No caso, essa pessoa precisa de análise e não de impeachment.
O que se discute é: a Dilma matou ou não matou? Ou,
nos termos do impeachment: ela cometeu ou não algum dos atos especificados na
Constituição e na Lei n.º 1.079/50, que configuram o crime de responsabilidade?
Em caso negativo, o impeachment seria um golpe? É aqui que reside a
controvérsia e não no processamento do impeachment em si.
Delimitado os termos da controvérsia é preciso
afirmar: inexistindo as hipóteses previstas em lei e na Constituição para o
impeachment, há golpe. Golpe parlamentar, mas golpe ainda assim.
O golpe não se perfaz unicamente por meio de intervenção
militar, mas também pelo parlamento, quando deputados e senadores se utilizam
de mecanismos legais para atender a seus próprios interesses e de organizações
e empresas que os financiam. O rito decidido pelo STF é exatamente isso: um
rito. Não diz respeito à controvérsia que se coloca.
O objeto da controvérsia é: pedaladas fiscais e
decretos suplementares. Nada além disso, nem preconceitos, nem viagens a Miami
adiadas.
O fato, por sua vez, é: pedaladas fiscais e decretos
suplementares, na forma descrita na denúncia, não são crimes de
responsabilidade previstos em lei e Constituição. Por isso, não há meias
palavras: é golpe (e ponto).
Ainda que imaginemos, por argumentação, a hipótese de
crime. Haveria golpe? Também, pois o que se está julgando, como é público e
notório, não são esses atos objeto de controvérsia, mas a popularidade, os
erros e acertos do governo.
As motivações dos deputados ao votarem evidenciou
isso. Os interesses empresariais (financiamento da Fiesp e campanha da Globo),
também. É bom, portanto, que aqueles que defendem o impeachment compreendam
muito bem os atos imputados à Presidenta, sob pena de serem vistos, eles
também, como golpistas.
A história cobrará.
São Paulo, 22 de abril de 2016.
Felipe Gomes da Silva Vasconcellos
Advogado Sindical, Mestre em Direito do Trabalho pela
Faculdade de Direito da USP.
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