sexta-feira, 8 de abril de 2016

Boa notícia: Ratificação da Convenção 189 - Domésticas. Pres. Dilma envia ao Congresso mensagem visando sua ratificação

 

Maximiliano Nagl Garcez

Advogado de trabalhadores e entidades sindicais e consultor em processo legislativo. Diretor para Assuntos Legislativos da ALAL - Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas

 

 

1.      Mensagem n.132, de 7.4.2016: ratificação da Convenção n. 132 e da respectiva Recomendação n. 201, da OIT - Organização Internacional do Trabalho.

 

Parabenizo a iniciativa da Presidenta Dilma, de enviar ao Congresso Nacional (conforme DOU de hoje, 8.4.2016, pág. 3) a Mensagem n. 132, de 7.4. 2016. Encaminhamento ao Congresso Nacional dos textos da Convenção sobre o Trabalho Decente para as Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos (nº 189) e respectiva Recomendação (nº 201), da Organização Internacional do Trabalho.

 

A Convenção n. 189 e a Recomendação n. 201 foi aprovada em 16.6.2011 pela Plenária da Conferência Internacional do Trabalho, por 396 votos a favor, 16 votos contra e 63 abstenções (ou seja, com voto de 83% dos delegados presentes). A Recomendação contou com 434 votos a favor, 8 contra e 42 abstenções (89% dos delegados presentes votaram a por sua adoção).

 

Divulgo abaixo resumo elaborado pela OIT sobre o conteúdo da Convenção n. 189 e da Recomendação n. 201 (íntegra disponível em http://www.oit.org.br/sites/default/files/topic/housework/doc/nota_5_convencao_recomendacao_450.pdf):

 

Convenção n. 189:

 

Artigos

“1 e 2 Definições e cobertura: Trabalho doméstico: aquele realizado em ou para domicílio (s); trabalhador: (sexo feminino ou masculino) quem realiza o trabalho doméstico no âmbito de uma relação de trabalho, estando excluídos aqueles/as que o fazem de maneira ocasional e sem que seja um meio de subsistência. A convenção se aplica a todos/as trabalhadores/as domésticos/as. Há possibilidade de exclusão de categorias, desde que justificadas (outra proteção equivalente ou questões substantivas).

3 e 4 Direitos humanos e direitos fundamentais do trabalho: Implementação de medidas efetivas para garantir estes direitos. Trabalho Infantil Doméstico: Estabelecimento de idade mínima, em consonância com convenções associadas ao tema (nº 138 e 182), e adoção de medidas com relação a trabalhadores/as com menos de 18 anos.

5 Proteção contra abusos, assédio e violência: adoção de medidas nestes temas.

6 Condições de emprego equitativas e trabalho decente: adoção de medidas efetivas nestes temas.

7 Informação sobre termos e condições, quando possível em contratos de trabalho.

8 Proteção às/aos trabalhadoras/es domésticas/os migrantes: oferta de emprego por escrito/contrato de trabalho com condições estabelecidas no artigo 7, ainda no país de origem.

9 Liberdade para decidir moradia, se acompanha ou não membros do domicílio em suas férias e quanto a manter em posse seus documentos.

10 Jornada de trabalho: medidas para assegurar jornada, compensação de horas extras e períodos de descanso diários, semanais (24 horas consecutivas)  e férias. Tempo em que trabalhadores/as estão à disposição conta como horas de trabalho.

11 Estabelecimento de remuneração mínima.

12 Remunerações e proteção social: pagamentos em dinheiro, em intervalos regulares e pelo menos uma vez ao mês. Possibilidade de pagamento in natura, desde que estabelecidas condições para que não seja desfavorável.

13 e 14 Medidas de saúde e segurança no trabalho; proteção social e proteção à maternidade.

15 Agências de emprego privadas: condições de funcionamento; proteção contra abusos de agências de emprego mediante obrigações jurídicas.

16 Acesso a instâncias de resolução de conflitos.

17 Inspeção do Trabalho: adoção de medidas e possibilidade de acesso ao domicílio, com respeito à privacidade.

18 As disposições da Convenção deverão ser colocadas em prática por meio da legislação nacional, de acordos coletivos e de outras medidas adicionais com relação aos/às trabalhadores/as domésticos/as.

19 a 27 Procedimentos para adoção, ratificação e implementação da convenção.”

 

Recomendação n. 201

 

Artigos

 

“2 Liberdade de associação e direito à negociação coletiva: revisão da legislação nacional no sentido de tornar efetivos estes direitos. Direito dos/as trabalhadores/as domésticos/as e dos empregadores/as terem suas próprias organizações.

3 Exames médicos: princípio da confidencialidade; impedimento de exames de HIV e gravidez e não-discriminação em função de exames.

4 Medidas com relação aos exames médicos: informação sobre saúde pública.

5 Identificação e proibição de trabalho doméstico insalubre para crianças, proteção para trabalhadores/as domésticos/as jovens: para estes últimos, limitação da jornada; proibição de trabalho noturno; restrição quanto a tarefas penosas e vigilância das condições de trabalho.

6 Informações sobre termos e condições de emprego; estabelecimento de informações em contratos.

7 Proteção contra abuso, assédio e violência: estabelecimento de mecanismos de queixa; programas de reinserção e readaptação de trabalhadores/as vítimas.

78-13 Jornada de trabalho: registro exato das horas trabalhadas, das horas extras e dos períodos de disponibilidade imediata para o trabalho de fácil acesso para os/das trabalhadores/as; regulamentação do tempo em que o trabalhador/a está disponível para o trabalho; estabelecimento de medidas específicas para trabalho noturno; estabelecimento de pausas durante jornada diária; estabelecimento de descanso semanal de 24 horas, em comum acordo; compensação por trabalho em dia de descanso; acompanhamento dos membros do domicílio nos períodos de férias não deve ser considerado como férias do/a trabalhador/a.

14-15 Proteção quanto à remunerações e pagamento in natura: limitação de pagamento in natura; critérios objetivos para cálculo do valor; considerar somente questão de alimentação e alojamento; proibição de incluir artigos relacionados ao desempenho do trabalho; informações precisas quanto aos valores do pagamento.

17 Condições adequadas de acomodação e alimentação.

18 Prazo para busca de outro emprego e tempo livre durante o trabalho em casos de término do emprego por iniciativa do empregador/a para trabalhadores/as que moram nas residências.

19 Saúde e segurança: Medidas e dados sobre saúde e segurança no trabalho; estabelecimento de sistema de inspeção.

20 Adoção de medidas para contribuição à previdência social.

21 e 22 Trabalhadores/as migrantes: sistema de visitas; rede de alojamento de urgência; linha telefônica de assistência; informações quanto às obrigações dos empregadores, legislação e direitos no caso dos trabalhadores/as nos países de origem e destino; repatriação.

23 Agências de emprego privadas: promoção de boas práticas das agências privadas de emprego com relação ao trabalho doméstico.

24 Inspeção do trabalho: estabelecimento de condições para a inspeção do trabalho.

25 Políticas e programas: para o desenvolvimento continuado de competências e qualificação, incluindo alfabetização; para favorecer o equilíbrio entre trabalho e família; formulação de dados estatísticos sobre trabalhadores/as domésticos/as.

26 Cooperação internacional para proteção dos trabalhdores/as domésticos/as.”

 

2.      Da redação da Emenda Constitucional

 

A Emenda Constitucional n.66 foi fruto da luta histórica das domésticas e domésticos do Brasil, e foi possível ante a firme atuação dos Presidentes Lula e Dilma, que defenderam sua aprovação no Congresso Nacional.

 

Segue a redação da Emenda:

“Altera a redação do parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:

Artigo único. O parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 7º .........................................................

......................................................................

Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VII, VIII, X, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XXI, XXII, XXIV, XXVI, XXX, XXXI e XXXIII e, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, os previstos nos incisos I, II, III, IX, XII, XXV e XXVIII, bem como a sua integração à previdência social.” (NR)

 

3.      Da regulamentação precarizante

 

Lamentavelmente, quando da regulamentação da referida Emenda Constitucional, setores conservadores do Congresso Nacional aprovaram a Lei Complementar n.  150, de 1º de junho de 2015,  que restringe indevidamente direitos previstos de modo claro na E.C. 72, sendo por isso inconstitucional.

 

Dentre os principais retrocessos contidos na LCP n. 150, cito o banco de horas, que na prática reduz imensamente a principal conquista contida na E.C. 72:  o direito à limitação da jornada.

 

O banco de horas, anual, confuso e sem qualquer negociação coletiva,  tornou letra quase morta a conquista da limitação da jornada de trabalho por meio da Emenda Constitucional n. 72, trazendo na prática de volta o período pré-PEC, o que seria retrocesso inadmissível.

 

Outros retrocessos contidos na LCP se referem a: a)  doméstica “viajante” com direitos limitados; b)  estímulo às despedidas por justa causa em sistemática de multa do FGTS como poupança controlada pelo empregador; c) papel reduzido das entidades sindicais de trabalhadores domésticos.

 

4.      Síntese

 

O envio pela Presidenta Dilma de Mensagem ao Congresso Nacional, ratificando a Convenção 189 e a Recomendação n. 201, é notícia alvissareira.

 

É necessário garantir a plena igualdade de direitos entre domésticos e os demais trabalhadores. Caso se considere adequado diminuir os custos dos patrões, o único modo constitucional e justo de fazê-lo é com isenções fiscais ou previdenciárias, mas nunca violando os direitos conquistados com muita luta pelos domésticos e domésticas.

 

Cremos que não se mostra justo continuar conferindo ao doméstico uma condição de “cidadão de segunda categoria”. Como já disse Tarso Genro, é injusto querer dar uma situação jurídica rebaixada aos domésticos e domésticas: “O empregado doméstico (...) possui tantas obrigações e responsabilidades (às vezes até mais), como as possui o empregado comum, agravadas com a grande dose de confiança que deve informar a relação, já que esta se dá, normalmente, no recinto privadíssimo da residência. Sua consideração como contrato especial advém da verdadeira aberração e discriminação que ele representa.” (GENRO, Tarso Fernando. Direito Individual do Trabalho: uma Abordagem Crítica. 2. ed. São Paulo. LTr, 1994. p. 107-8).

 

Espero que o Congresso Nacional aprove rapidamente a Convenção n. 189 e  sua respectiva Recomendação. A dívida que a sociedade brasileira tem com as domésticas e domésticos é gigantesca, ante o grotesco histórico de opressão, discriminação, precarização e sofrimento causado a tal categoria. A aprovação das referidas medidas servirá ao menos para mitigar um pouco tal dívida gigantesca.

 

 

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