"Uma empregada portadora de deficiência buscou a Justiça do Trabalho alegando ter sido discriminada e ofendida em sua dignidade, honra e imagem. Segundo afirmou, sua contratação foi fraudulenta e visou a simular o cumprimento do disposto no artigo 93 da Lei 8.213/91. Contratada para prestar serviços uma vez por semana com jornada de 04 horas, ela ficou à disposição nos demais dias, apesar de sua plena capacidade para exercer as atividades inerentes à função contratada, nas mesmas condições que os demais empregados.
A juíza Maria Irene Silva de Castro Coelho, em sua atuação na 2ª Vara de Belo Horizonte, deu razão à reclamante. Segundo observou a magistrada, o contrato de trabalho firmado entre as partes dispunha que a trabalhadora exerceria a função de orientadora de pausa, percebendo o salário mensal de R$84,16, proporcional à duração semanal do trabalho de 04 horas. Lembrou a magistrada que o artigo 93 da Lei nº 8.213/91 dispõe que a empresa com 100 ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas. Ela explicou os objetivos da lei:
"A norma, ao impor às empresas a contratação de pessoas portadoras de necessidades especiais e reabilitados, visa à satisfação do disposto no inciso XXXI do art. 7º da CF/88, que proíbe qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência. Além disso, a imposição legal, ao incentivar a inserção no mercado de trabalho desse grupo de pessoas excluídas, objetiva, ainda, assegurar o direito à isonomia (art. 5º, caput, CR/88) e aos princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho (art. 1º, III e IV, CR/88), além de buscar o cumprimento do disposto no art. 170, caput, da CR/88, segundo o qual, a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (. . .)"
No caso, ela verificou que a empresa descumpriu as disposições legais e constitucionais de proteção às pessoas portadoras de deficiência, uma vez que as condições de trabalho impostas à trabalhadora, como a prestação de serviços por apenas 04 horas semanais, destoam daquelas dos demais empregados com jornada de 6h e 8h diárias, conforme se pode verificar nos Acordos Coletivos de Trabalho celebrados entre a empregadora e o SINTTEL/MG. A juíza salientou que, nos autos da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em face da empresa demandada, processo nº 00611-2007-021-03-00-7, foi rechaçada a conduta de admissão dos portadores de deficiências para trabalhar apenas 4 horas semanais, com o único objetivo de atender à determinação constante do artigo 93 da Lei 8.213/91.
A juíza transcreveu trechos desse processo no qual se revelou, mediante fiscalização, que a empresa agia em franco desrespeito à ordem jurídica, já que admitia os portadores de deficiências como trainee, para laborar 4 horas semanais, mediante salário de R$73,50. Inclusive eles recebiam ordens para ficar em casa aguardando a convocação, procedimento destituído de qualquer amparo legal. Assim, além de deixar de observar preceito de ordem pública (artigo 93 da Lei 8213/91) e os valores constitucionais, a empresa ainda praticou fraude: a contratação irregular de pessoas portadoras de deficiências, com o intuito de levar a erro o Ministério Público, no momento da fiscalização, fatos esses que ensejaram a condenação da empresa por danos morais coletivos.
Nesse cenário, e considerando que as lesões praticadas pela empregadora aos direitos da empregada portadora de deficiência implicaram violação aos princípios constitucionalmente assegurados, como o da cidadania, da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho, além da proibição de discriminação do trabalhador com deficiência (art. 1º, incisos II, III e IV, art. 5º, caput, inciso XLI, art. 7º, XXXI, e art. 170, caput e inciso VIII, CR/88), a juíza concluiu comprovado o dano moral sofrido pela trabalhadora, pela forma diferenciada dos demais como ela foi contratada.
A empresa foi condenada a pagar indenização por danos morais, arbitrados em R$10.000,00. Mas não foi só. A julgadora também entendeu que a conduta ilícita da empresa impediu a empregada de receber a remuneração correspondente aos pisos salariais previstos em norma coletiva. Por isso, deferiu o pedido de pagamento de indenização por danos materiais correspondente às diferenças salariais que a reclamante deixou de receber, por todo o contrato de trabalho, considerando o piso salarial para jornada de 6h diárias descrito nos instrumentos coletivos da empregadora. E, diante das irregularidades constatadas, a juíza também determinou a expedição de ofício ao MPT, para as providencias cabíveis."
Fonte: TRT 3ª Região
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