"A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho excluiu da condenação imposta pela Justiça do Trabalho da 3ª Região (MG) à empresa Sá Carvalho S. A. a determinação de dispensar, em 120 dias, todos os empregados que foram transferidos para a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) por ocasião da transferência de seu controle acionário. A dispensa foi determinada em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, que alegava a necessidade de concurso público para ingresso nos quadros da concessionária de energia elétrica mineira. A Turma, porém, considerou válidos os contratos firmados antes da transferência acionária.
Mudança de controle
A Sá Carvalho é uma usina hidrelétrica que pertencia à Acesita (Companhia Aços Especiais de Itabira, atual Aperam South America), e seu controle acionário foi vendido à CEMIG em 2000. Em 2007, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a ação civil pública sustentando a impossibilidade de contratação de empregados sem concurso e pedindo que a Justiça do Trabalho reconhecesse a invalidade dos contratos de trabalho em vigor relativos aos empresados absorvidos pela CEMIG.
A pretensão foi deferida pela 9ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (MG) e mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Para o TRT, a partir da alteração de natureza jurídica de empresa privada para sociedade de economia mista, a Sá Carvalho estaria obrigada a observar a exigência do artigo 37, inciso II, da Constituição da República e regularizar todos os contratos já existentes. "Com a integração da empresa à administração pública indireta houve, sim, investidura dos trabalhadores em emprego público, sem que nenhum deles se submetesse a aprovação em concurso público", afirmou o acórdão regional. "Tal ilegalidade não há de subsistir indefinidamente."
A CEMIG e o Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais (Sindieletro) recorreram então ao TST. Na sessão de julgamento do recurso, o advogado da CEMIG afirmou que a Segunda Turma "talvez nunca mais julgue um processo como esse, em que o empregador vem defender os empregados".
A empresa sustentou que o prazo de apenas 120 dias para a dispensa foi "desarrazoado", e alegou a necessidade de manutenção da operação das usinas por pessoal e mão de obra altamente qualificados. Argumentou, ainda, que os trabalhadores integrados a seus quadros estariam protegidos pelos artigos 6º e 7º, inciso I, da Constituição e 10 e 448 da CLT, que incluem o trabalho como direito social e protegem a relação de emprego da despedida arbitrária e das mudanças na estrutura jurídica da empresa.
Ponderação de princípios
O relator do recurso, ministro José Roberto Freire Pimenta, assinalou que a discussão sobre o tema exige a ponderação dos princípios, valores e dispositivos constitucionais relativos à questão – entre eles os princípios da dignidade da pessoa humana, da continuidade do emprego e a regra do concurso público. "Na ocasião da mudança do controle, os empregados já trabalhavam regularmente na empresa privada, em virtude de contratos de trabalho celebrados em datas incontroversamente anteriores com sua empregadora", afirmou.
Para o ministro, essa circunstância "em nada se assemelha" à prevista no artigo 37, inciso II, da Constituição. "Não se trata, aqui, de ingresso inicial ou superveniente em cargo ou emprego público sem concurso pura e simplesmente, como entendeu a decisão regional", assinalou. Ao contrário, os contratos de trabalho, celebrados com uma empresa privada, já estavam em curso.
"Os trabalhadores, por óbvio, agiram de boa-fé", destacou José Roberto Freire Pimenta. Por isso, na sua avaliação, não devem sofrer as consequências negativas de "uma genuína sucessão trabalhista", instituto que tem por objetivo justamente a proteção dos direitos dos empregados nas alterações jurídicas da empresa.
O presidente da Segunda Turma, ministro Renato de Lacerda Paiva, classificou a situação de "surrealista", e lembrou que a sucessão importa a unicidade do contrato de trabalho. O relator concluiu lembrando que o artigo 448 da CLT prevê expressamente que "a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados".
Tendo em vista não se tratar de admissão original no serviço público e com fundamento nos princípios da continuidade da relação de trabalho e da dignidade da pessoa humana, a Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso e excluiu da condenação a determinação de dispensa, no prazo de 120 dias, dos trabalhadores da Sá Carneiro absorvidos pela CEMIG."
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