"Na festa de fim de ano da Celesc houve uma atração extra: um galão de Toddyinho. Oferecer a bebida foi uma resposta bem-humorada da nova gestão da empresa a uma piada que corria entre os funcionários da estatal depois que executivos entre os 35 e 45 passaram a liderar a companhia.
Com a chegada dos "meninos" ao comando, a brincadeira entre os antigos era que o cafezinho ia ser substituído na empresa pelo achocolatado infantil.
Pouco mais de dois anos depois de assumir a empresa, o novo time da Celesc conseguiu agradar governo, funcionários, sindicato e também - quase todos - acionistas.
O foco do trabalho é eliminar o mal-estar com a empresa causado por anos de administrações que privilegiaram o uso político do negócio, com loteamento de cargos e fechamento de contratos que hoje estão sendo reavaliados. Mudanças no estatuto serviram para blindar a Celesc dessas interferências que foram prática no passado.
A virada está sendo comandada pelo presidente Antonio Marcos Gavazzoni, 36, que assumiu o posto em 2010, vindo da Secretaria da Fazenda do Estado.
Modelo, que inclui comitês de auditoria e financeiro, foi inspirado na CPFL e Cemig
O principal estímulo para que a Celesc pudesse transformar-se em uma empresa pública eficiente e competitiva veio do governador de Santa Catarina, João Raimundo Colombo. Ele esteve no comando da estatal no início dos anos 90, por quase dois anos e deixou a empresa frustrado por não ter conseguido ser o presidente que desejava. Transferiu a missão para Gavazzoni, que aceitou assumir a Celesc com duas condições: formar uma equipe técnica e unificar o comando da estatal.
Até então, a Celesc funcionava dividida em três áreas, cada uma com presidente e diretoria próprios - geração, distribuição e holding. Nenhuma das três áreas se conversavam. O conselho de administração tinha interferência apenas na holding e estava fora do processo do negócio da empresa.
"A Celesc vivia em conflito permanente, cada um fazia o que bem entendia", resume Gavazzoni.
Logo após assumir, Gavazzoni reuniu sua equipe de técnicos com o governador e representantes de acionistas minoritários - a gestora de recursos Tarpon, a Previ e o investidor Lirio Parisotto. No encontro, traçaram uma lista de tarefas para o primeiro ano de mudanças na empresa. Se elas fossem implementadas com êxito, o combinado é que permaneceriam mais três anos na gestão.
Transpor regras de empresas privadas para uma estatal foi mais trabalhoso do que em princípio se pensava. Mas o grupo conseguiu construir um novo estatuto, que teve apoio dos funcionários, sindicatos e de todos os acionistas, inicialmente.
"Não adiantaria fazer essas mudanças nesse governo se elas não fossem perenizadas. Não poderíamos correr o risco de que, com um novo governo, a ingerência política na empresa voltasse a acontecer e o trabalho fosse perdido", conta Gavazzoni.
As alterações no estatuto cumpriram esse papel. Antes, o governo indicava 7 de 13 conselheiros. Agora eles são escolhidos por quórum qualificado e só ascendem ao órgão se aprovados pelos minoritários. O mesmo método vale para a escolha de diretores. "Fomos olhar os estatutos de outras companhias, para ver o que funciona e o que não funciona", diz o presidente da Celesc. Segundo ele, a busca foi replicar as melhores práticas de CPFL e Cemig. "Quem compra ação da empresa agora sabe que as regras são claras", diz.
Uma forte e recorrente crítica à Celesc era a de que a empresa investia muito, mas investia mal. O novo estatuto tem premissas de limitação do investimento a uma proporção do Ebitda registrado no ano anterior. A empresa não tem problemas de alavancagem e após as regras de proteção de capital, duas vezes o Ebtida é o seu nível máximo de endividamento.
A Celesc não possuía um plano diretor. Agora existe a obrigatoriedade de um planejamento por cinco anos. Foram criados comitês de auditoria, financeiro, jurídico, recursos humanos e assuntos estratégicos e comerciais, cada um deles coordenados por representantes dos minoritários.
O que ninguém esperava era que a harmonia da empresa poderia ser abalada por um representante dos próprios acionistas. Lirio Parisotto, que tem perto de 11% da companhia, cansou de esperar pelos resultados da Celesc. Quando alterou o estatuto em janeiro, a empresa definiu como sua atividade apenas a energia. A estatal tinha um leque amplo de atividades - tem participação em transmissão de gás, com 51% da SC Gás, e em saneamento, com fatia de 15,5% da Casan.
Surpreendendo a todos os acionistas, Parisotto foi contrário à alteração no estatuto. O temor era de que a empresa vendesse as participações em outros negócios por valores irrisórios, como já ocorreu no passado. Por discordar dos novos rumos, ele queria que ela comprasse suas ações. Conceder o direito de retirada a Parisotto, pelo valor patrimonial da ação, significaria um desembolso de caixa da Celesc de R$ 200 milhões. Abrir mão dos recursos seria prejudicial à empresa, que passa por uma reorganização e essa modificação do objeto social acabou desfeita.
A insatisfação de Parisotto é com a gestão anterior, como ele mesmo já deixou claro em entrevista ao Valor. Porém ele afirma que não quer mais esperar por uma virada na empresa e, aparentemente, enxergou na mudança do estatuto uma oportunidade de vender suas ações, uma vez que não acha comprador em bolsa.
Em meio a seu descontentamento, já afirmou que pode recorrer à Justiça, descontente com o fato de a companhia voltar atrás na mudança do estatuto. A ação dele poderá até mesmo responsabilizar a nova gestão por problemas da antiga. No mercado, há um temor de que, uma vez que os novos executivos nada tem a ver com os problemas anteriores, poderiam deixar a empresa se tiverem de responder pelo passado. Questionado, Gavazzoni desconversa. Diz que respeita Parisotto e não quer polêmicas. Apenas destaca: "Responsabilizar a nós pelo passado seria uma injustiça", diz."
Extraído de http://www.valor.com.br/impresso
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