"“Na Delegacia de Investigação e Captura (DIC) de João Pessoa, me colocaram nu, num circulo de marginais comuns, que começaram a me bater até eu cair no chão. Seis policiais conduziam essa triste cena. Me colocaram em pau de arara, me deram choques elétricos e socos em todas as partes do corpo”. Foram episódios como esses relatados pelo médico Eraldo Fernandes na Comissão Estadual da Verdade da Paraíba sobre suas prisões em Pernambuco, Paraíba e São Paulo.
No ano de 1968, Eraldo era estudante de medicina da UFPB, militando no movimento estudantil universitário e no Partido Comunista Revolucionário Brasileiro (PCBR). Antes, tinha sido do Partido Comunista Brasileiro (PCB) onde abriu dissidência em 1967, criando a Corrente Revolucionária, juntamente com os estudantes Eduardo Ferreira (Batata), Rômulo Araújo Lima, Eric Rosas e Emilson Ribeiro.
Seu nome consta na relação dos delegados presos no Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) de outubro de 1968, realizado em Ibiúna, São Paulo, o que provocou na suspensão de sua matrícula por 3 anos do curso de medicina da UFPB.
Quanto ao assalto à empresa Souza Cruz ocorrido em 5 de maio de 1969, Eraldo esclareceu que participou da elaboração do plano enquanto era membro do PCBR, mas não fez o assalto. “Fomo até o local no dia 3 de maio. Ai apareceu um caminhão e atrapalhou a ação, o que motivou o adiamento do assalto. Sabedores do nosso plano e com raiva por nós havermos saído do PCBR para entrar na Ação Libertadora Nacional (ALN), de Carlos Marighela, a direção do PCBR de Pernambuco veio aqui e realizou o assalto, sobrando a culpa para nós”.
Com a queda do aparelho de Tambaú (casa onde mantinham documentos, armas erealizavam reuniões), boa parte do pessoal do nosso grupo foi presa. Eraldo, Eduardo Ferreira e Emilson Ribeiro conseguiram fugir para Recife, onde, semanalmente, se encontravam em alguns pontos da cidade. Foi num convento de Olinda que Eraldo Fernandes foi preso após ter sido dedurado por uma freira. “Tinha um tal de Miranda que me torturou muito em Recife. Depois fui trazido para João Pessoa, onde fui torturado no DIC e na Polícia Federal. Fui condenado a 3 anos e quatro meses de prisão pela 7ª região, cumprindo pena na Penitenciária Modelo do Roger”.
Ao sair da prisão em 1972, Eraldo viajou para São Paulo onde vai morar numa “sociedade comunista”, que reunia vários paraibanos perseguidos pelo regime militar, como Leda Rejane e seu marido Everardo Nóbrega, Eduardo Jorge, Ariosvaldo Diniz e Chico Dantas. Formaram um grupo independente, mas mantendo contato com a organização Val-Palmares.
“Um dia a casa caiu nas mãos do DOI-CODI de São Paulo, onde fomos sequestrados e mantidos presos clandestinamente por quase dois meses. Fui torturado pelo Capitão Ubirajara, esse que nega ter torturado presos políticos durante o regime militar. Ele e outros canalhas tiravam os presos da cela e não retornava mais com eles. Era um pavor”, lembrou Eraldo.
Quando saiu do DOI foi levado para o DOPS de São Paulo, onde passou três meses preso. Foi lá que conheceu o famigerado Delegado Freury. Eraldo disse que Freury “tinha uma brincadeira de tirar preso da cela e levar para uma sala para ver alguém sendo torturado. Certa vez vi uma jovem nua, com cassetete no ânus, com fios de choque elétricos prendidos nos seios e nas partes intimas. Estava toda ensanguentada. Uma cena triste. Tinha isso como uma ameaça de Freury. Não sei quem era essa jovem e também não sei se ela sobreviveu. Estava há pouco tempo em São Paulo e conhecia pouca gente”.
Eraldo Fernandes voltou à Paraíba em 1974 e conseguiu concluir seu curso de medicina na UFPB e foi trabalhar em São Paulo. Ajudou na fundação do Partido dos Trabalhadores (PT) e exerce a sua profissão no interior paulista. Seu depoimento na Comissão Estaudal da Verdade foi assistido pela sua companheira Ivani Porfírio Fernandes."
Fonte: CEV
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