terça-feira, 17 de maio de 2011

"Distribuidoras abrem rombo na Eletrobras" (Fonte: Valor Econômico)

"Autor(es): Josette Goulart | De São Paulo

"A situação suscita dúvida sobre a continuidade operacional dessas empresas", concluíram os auditores da PriceWaterhouseCooopers sobre a saúde financeira das distribuidoras da Eletrobras. No fim de 2010, elas tinham excesso de passivos sobre ativos circulantes de R$ 554,3 milhões. "O que os auditores estão dizendo é que a holding terá de continuar bancando as operações", diz o presidente das distribuidoras, Pedro Hosken. "O caixa não é suficiente para pagar as dívidas". Desde 2008, quase R$ 5 bilhões em dívidas das distribuidoras do Acre, Alagoas, Amazonas, Piauí, Rondônia e Roraima com a holding foram transformadas em capital.
 
A frágil situação financeira das distribuidoras de energia da Eletrobras ficou ainda mais evidente depois da divulgação, com atraso de quase dois meses, do balanço de 2010 da companhia. Pela primeira vez, os auditores independentes da empresa foram taxativos: "A situação suscita dúvida sobre a continuidade operacional dessas empresas". O problema a que se referem os auditores da PricewaterhouseCooopers é um rombo de mais de meio bilhão de reais entre passivos e ativos circulantes dessas distribuidoras.
A Eletrobras não só está ciente das dificuldades como o presidente das distribuidoras, Pedro Hosken - que está deixando o cargo para assessorar diretamente o presidente da holding-, diz que é difícil resolver a situação no curto prazo. A distribuidora tem que ter rapidez, produtividade e padrão. "Isso não faz parte de uma empresa pública. Os prazos no ambiente público são mais lentos do que no privado", disse. "Esse tipo de concessão não é para ser pública, a não ser que se crie uma cultura, que toma um longo prazo. Todos do setor sabem disso, o presidente da Eletrobras sabe, o governo sabe e os políticos estão começando a perceber."
As seis distribuidoras do grupo talvez não tenham esse longo prazo para resolver seu rombo. Todas elas têm a concessão vencendo em 2015, e mesmo que o governo se decida pela prorrogação, essa é uma prerrogativa de empresas saudáveis. Além disso, terão que enfrentar um processo de revisão das regras tarifárias que vai reduzir as margens de ganhos e as receitas das distribuidoras no país.
Desde 2008, quase R$ 5 bilhões em dívidas com a holding das seis distribuidoras, que atendem os Estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Piauí, Rondônia e Roraima, foram transformadas em capital. A dívida que essas companhias ainda têm soma cerca de R$ 1,5 bilhão é em sua maior parte, entre 60% e 70%, subsidiada por recursos da Reserva Global de Reversão (RGR). O fundo RGR empresta a juros de 5% ao ano, mais taxa de administração que não chega a 2%, e sem qualquer correção monetária.
Nem todos esses privilégios, entretanto, foram suficientes para reverter a situação financeira das companhias nos últimos anos. Não é possível comparar os resultados em um período mais longo em função da alteração das regras contábeis. Pelo novo padrão internacional, entretanto, as distribuidoras registram prejuízos de mais de R$ 400 milhões tanto em 2009 quanto em 2010. "As empresas controladas do segmento de distribuição tem apurado prejuízos repetitivos em suas operações", diz o parecer dos auditores.
As novas regras contábeis também foram responsáveis por um prejuízo de mais de R$ 1,3 bilhão da Amazonas Energia, que também tem atividade de geração sob seu guarda-chuva. Segundo explica Hosken, esse prejuízo se deveu a provisões que pelas regras antigas não eram necessárias.
A reavaliação de ativos por conta do fim das concessões em 2015 afetou em R$ 500 milhões o resultado da Amazonas Energia. Além disso, ela teve que fazer uma provisão de créditos de PIS/Cofins de R$ 400 milhões.
"Os números não-recorrentes, em função da nova legislação, levaram ao prejuízo de R$ 1,3 bilhão", disse Hosken. Todos esses números só poderão ser melhor analisados na primeira semana de junho, quando a Eletrobras deve divulgar o balanço anual por empresa do grupo.
A Amazonas Energia tem também outros problemas sérios, principalmente na questão de perdas de energia em sua atividade. Enquanto o índice permitido de perdas pela Aneel é de 22%, o nível da companhia do Estado do Amazonas é de 42%. "Isso significa que R$ 400 milhões precisam ser bancados pelo acionista", diz Hosken. "Da mesma forma que os passivos apontados pela auditoria terão que ser bancados pela Eletrobras."
Segundo dados da empresa, nenhuma das distribuidoras consegue hoje atingir os níveis de gastos exigidos pela empresa de referência estabelecida pelo órgão regulador. Mas Hosken diz que os números foram melhorando ao longo dos últimos anos. Em gestão de material se gastava R$ 5 bilhões, segundo Hosken. Esse valor foi reduzido em 30%. Os processos de serviços que eram contratados por homem/hora foram alterados por unidade de serviço, o que dá grande economia. "Mas esse é um processo lento", disse Hosken. "São desafios que temos nas distribuidoras de médio ou longo prazo."
A companhia vive forte pressão, pois os prejuízos recorrentes afetam os números do grupo como um todo. A Eletrobras teve um lucro líquido de R$ 2,2 bilhões. O prejuízo das distribuidoras foi de quase meio bilhão de reais. Todos esses desafios serão agora assumidos por Marcos Aurélio Madureira, que foi diretor de distribuição da Energisa e também da Cemig. Ele é o terceiro presidente em três anos. O cargo já foi ocupado por Flávio Decat, que deixou a empresa para assumir a área no grupo Rede Energia e hoje é presidente de Furnas. Hosken, que era diretor financeiro de Decat, assumiu a presidência e agora deixa o cargo para assessorar diretamente o presidente da holding Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto.
A solução para as empresas de distribuição é um desafio para o próximo presidente. As pressões são muitas e de várias direções. O representante dos minoritários da Eletrobras defende uma espécie de privatização branca, que leve essas empresas para o Novo Mercado da BM&FBovespa, com uma diluição de capital. Dessa forma, a Eletrobras poderia recuperar o que já investiu nas empresas.
Outra forte pressão tem sido feita pelos governos estaduais. Com níveis de qualidade de serviço insatisfatórios, reconhecidos pela própria Eletrobras, os novos governantes já ventilam a possibilidade de retomar as empresas. Todas as distribuidoras que estão hoje sob o guarda-chuva da Eletrobras foram federalizadas quando os Estados devolveram às concessões ao governo. E a outra pressão é para a privatização de fato das empresas, que daria mais agilidade na recuperação das companhias. O problema é que elas teriam que ser vendidas em bloco, pois agentes privados têm interesse em apenas alguns ativos.
Para este ano, os investimentos previstos nas distribuidoras é de R$ 1,5 bilhão. Esses volumes terão que ser financiados, boa parte em RGR. Outros R$ 700 milhões serão necessários para o programa Luz para Todos."


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