"A estudante de Administração de Empresas de Campinas conseguiu firmar em 11 de novembro de 2004 o contrato de estágio (com extensão até 11 de novembro de 2006) com empresa que é prestadora de serviços para uma multinacional conhecida por sua atuação no ramo de refeições. Durante o dois anos em que atuou como assistente de departamento pessoal dessa multinacional, desempenhou as funções de elaboração de contratos de trabalho temporário, registro em CTPS, cálculo dos benefícios dos empregados, tais como vale transporte. Também era responsável pela entrega da CTPS aos empregados, pelos pagamentos, pela efetivação de empregados, e tambérm ouvia reclamações sobre a falta de pagamento de salários. Segundo ela, todas essas atividades “eram relacionadas com a faculdade cursada”.
Após o término do estágio, foi contratada por cinco meses, mediante contrato de trabalho temporário, e continuou desenvolvendo as mesmas atividades do período de estágio. Durante o tempo em que trabalhou para a empresa multinacional, exerceu as mesmas funções do assistente do departamento pessoal contratado como empregado, cujas mesmas funções da estagiária já desenvolvia há mais de dois anos. A estagiária chegou a substituí-lo durante suas férias.
A trabalhadora afirmou que durante o contrato de estágio e, depois, de trabalho temporário, cumpriu o horário das 8h às 19h30, em média, com aproximadamente 30 minutos para almoço, e um sábado por mês, das 8h ao meio-dia. Essa carga horária excessiva dificultava a trabalhadora de chegar a tempo às aulas da faculdade, que começavam às 19h. Segundo ela, só conseguia chegar à escola às 19h50.
Ao fim do contrato de estágio, a trabalhadora firmou novo contrato no dia 13 de novembro de 2006, com a mesma empresa prestadora de serviços, dessa vez de trabalho temporário, e continuou trabalhando no mesmo lugar, com as mesmas atribuições. No dia 2 de abril de 2007, foi demitida sem justa causa. O Juízo da 10ª Vara do Trabalho de Campinas, onde correu a reclamação trabalhista, reconheceu o vínculo empregatício da trabalhadora desde a assinatura do contrato de estágio, condenando as empresas solidariamente ao pagamento de verbas e cumprimento de várias obrigações.
As duas empresas, inconformadas com a sentença, recorreram. O relator do acórdão da 10ª Câmara do TRT da 15ª, desembargador José Antonio Pancotti, confirmou o entendimento do Juízo de primeira instância e chegou a afirmar que “não há dúvidas de que as reclamadas, em fraude à legislação vigente, utilizam-se de contrato de estágio e de contrato temporário para a contratação dos empregados”.
O acórdão apresentou longa explicação sobre o contrato de estágio, com base na Lei 6.494/77, destacando as diferenças entre este e o contrato de trabalho. Lembrou que “não se tem dúvidas de que o estágio é uma forma de trabalho”, porém salientou que “não parece razoável interpretar o § 1º do art. 1º da Lei nº 6.494/77 como permissivo legal ilimitado para a utilização do estágio dissociado do seu objetivo primário. Do contrário, estaríamos a permitir a substituição de empregados por estagiários, para atender à demanda de mão de obra desqualificada, suprimindo-se os direitos trabalhistas e previdenciários para redução dos custos de produção, o que fere de morte os princípios constitucionais”.
A decisão colegiada da 10ª Câmara ainda destacou que “só se pode aceitar o estágio quando há, efetivamente, uma formação global do estudante, propiciando-lhe uma habilitação profissional específica”. Também ressaltou que o teor da cláusula 13 do Termo de compromisso de estágio estabelece que “a Empresa designará ao Supervisor de Estágio a responsabilidade do acompanhamento do Estagiário na Empresa, como também a realização de Avaliação de Desempenho”. Entretanto, “não há nos autos nenhuma prova de que tenha havido supervisão em relação aos trabalhos desempenhados pela reclamante, bem como não há menção a avaliações de desempenho”, afirmou a decisão.
O acórdão, porém, reconheceu que as reclamadas têm razão em parte quando alegam não deverem horas extras e seus reflexos, pleiteados pela trabalhadora. A decisão lembrou que, embora fosse ônus das reclamadas comprovar o controle de frequência da trabalhadora, elas não o fizeram. Os depoimentos da trabalhadora e de sua testemunha, bem como as informações contidas na inicial a respeito dos horários de trabalho e horas extras divergiram, e por isso o acórdão concluiu pela reforma da sentença apenas para “fixar a jornada das 8h00 às 18h40, com uma hora de intervalo intrajornada, de segunda a sexta-feira”, e manteve a condenação das reclamadas ao pagamento de horas extras, obedecidos os demais parâmetros fixados pelo Juízo de origem, e excluiu da condenação o intervalo intrajornada. (Proc. 017700-36.2009.5.15.0129 RO) "
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