"Com base no voto do juiz convocado Rodrigo Ribeiro Bueno, a 8ª Turma do TRT de Minas confirmou a sentença que considerou inválida a dispensa pela Copasa de um empregado dependente de álcool e crack e determinou a reintegração dele ao emprego. No caso, ficou comprovado que o trabalhador se encontrava sob o efeito de substância entorpecente quando praticou as faltas que ensejaram a dispensa, entendendo os julgadores que ele estava incapaz de entender o caráter ilícito e lesivo das condutas adotadas.
Na condição de sociedade de economia mista, que integra a administração pública indireta do Estado de Minas Gerais, a Copasa motivou o ato de rompimento do contrato. Ela apresentou o processo administrativo instaurado que culminou na dispensa do reclamante por justa causa. Nele, constou que o empregado apresentou comportamento incompatível com a função, foi advertido por ter se ausentado sem prévio aviso e suspenso por dirigir veículo sem ter credenciamento e depois por ter se apropriado de uma motocicleta da empresa. Finalmente, foi surpreendido furtando hidrômetros da empresa em três ocasiões. O próprio reclamante confessou os furtos, apontando, no entanto, que estaria sob efeito de drogas quando tudo ocorreu.
Conforme observou o julgador, o quadro de dependência de álcool e crack era de conhecimento da empresa, tanto que ela chegou a inscrevê-lo no Programa de Prevenção e Atendimento ao Sujeito em relação ao Álcool e às Drogas (PASA), em 2010. Houve tentativa de encaminhamento para tratamento em clínicas conveniadas, mas sem sucesso. Um relatório apresentado revelou que o trabalhador não possuía motivação para mudança de comportamento, nem disponibilidade para abstinência de consumo de substâncias psicoativas, mesmo depois de diversas internações em clínicas especializadas. Em abril de 2013, a comissão do PASA desistiu do tratamento por entender que o prognóstico do empregado era desfavorável à recuperação.
Embora reprovando os furtos praticados pelo agente de saneamento, o relator considerou que o empregado não poderia ser dispensado, por se encontrar incapaz de entender a ilicitude do fato. "O empregado estava premido da necessidade de apropriar-se de algum objeto patrimonial para que pudesse vendê-lo e assim conseguir dinheiro para saciar o vício físico-químico", registrou no voto. Para o julgador, não se pode admitir que a penalidade máxima existente no Direito do Trabalho seja utilizada para punir um empregado com doença crônica grave. Ele não identificou o dolo e a culpa no caso, ponderando que o crack retira do usuário a capacidade de discernimento e de autocontrole, alijando-o de sua própria vontade. Ademais, lembrou que o agente de saneamento poderá ter direito a aposentadoria por invalidez, caso não haja recuperação para a doença.
"Não se poderia validar a dispensa tal qual perpetrada, deixando esse empregado, neste momento de extrema vulnerabilidade e que mais necessita de apoio familiar e social, à margem de sua própria sorte", prosseguiu, frisando que a dispensa do empregado doente também afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da função social da empresa e da proteção da saúde. Isto porque, além de excluí-lo do mercado de trabalho, o deixa sem as proteções de que mais necessita em situação de doença. "Em se tratando de patologia crônica, a reclamada não deveria ter desistido do trabalhador tão rapidamente, sem antes optar por afastá-lo do trabalho, continuando o tratamento médico iniciado, mas interrompido em 2013, e até encaminhá-lo ao INSS para tratamento mais efetivo e eventual recebimento de benefício previdenciário", ressaltou no voto.
A minuciosa decisão também se referiu a jurisprudência no sentido de vedar a dispensa do empregado acometido de alcoolismo crônico, doença catalogada no índice da Organização Mundial de Saúde, referência F.10.2, como "transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência". Segundo o magistrado, a justificativa é que o empregado que sofre de alcoolismo crônico deve ser encaminhado para tratamento e receber da empresa o apoio necessário para sua recuperação. O alcoólatra não pode ser dispensado em razão da compulsão que o impele a consumir descontroladamente a substância psicoativa responsável por retirar-lhe a capacidade de discernimento sobre seus atos.
Ainda de acordo com as ponderações do julgador, a mesma situação se verifica quanto à dependência física de outras drogas que incapacitem o trabalhador para suas atividades. Como exemplos, foram citados a maconha, cocaína e o crack, pois também são tratados pela medicina como doença (CID 10 F, 14, 17, 19), em razão da síndrome de abstinência.
"Ao invés de optar pela rescisão do contrato, competia à empregadora, seja por motivos humanitários, seja pela função social da empresa, afastá-lo do trabalho a fim de proporcionar-lhe tratamento médico, e até encaminhá-lo ao INSS para eventual recebimento de benefício previdenciário caso entendesse que a patologia era insusceptível de recuperação", constou da ementa do voto. Acompanhando o relator, os julgadores decidiram negar provimento ao recurso da Copasa para manter a sentença que declarou nula a dispensa e determinou a reintegração do agente de saneamento ao trabalho."
Íntegra: TRT-3
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