terça-feira, 27 de novembro de 2012

Sindicalistas e profissionais de comunicação debatem o jornalismo sindical (Fonte: Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior - ANDES-SN)


"Como acontece há 18 anos, foi realizado de 21 a 25 de novembro, no Rio de Janeiro, o 18º Curso Anual do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC). Ao reunir sindicalistas e jornalistas sindicais para trocar experiências e debater temas da atualidade, o curso trabalha no sentido de melhorar a comunicação dos sindicatos, dentro de uma perspectiva gramisciana de que o jornalismo sindical é um importante instrumento na luta pela hegemonia da classe trabalhadora.
A receita do curso NPC consiste no debate de temas da atualidade, exposição de experiências sindicais e oficinas. A preocupação do NPC é discutir os temas da atualidade a partir de vozes que não são ouvidas pela mídia tradicional. Nesses cinco dias, cerca de 250 participantes, de todos os cantos do país e de sindicatos mais diversos, puderam debater temas atuais, como a Comissão da Verdade, o marco regulatório das comunicações e da internet, feminismo, homofobia e criminalização da pobreza.
Jornalista e professor aposentado da Universidade Federal do Pará, o 1º vice-presidente do ANDES-SN na Regional Norte II, José Queiroz Carneiro, participou pela primeira vez do curso do NPC. “Achei interessante a posição do NPC de defender a construção de espaços alternativos de comunicação, já que a grande mídia geralmente é refratária aos direitos da classe trabalhadora”, avaliou.
“Eu, que atuei na grande mídia e atualmente colaboro semanalmente com uma coluna dominical no jornal O liberal, refleti bem sobre essa questão. Mas, como alguns palestrantes também disseram neste curso, temos de aproveitar os espaços dados pela mídia tradicional para passar nossas mensagens”, argumentou.
Além de Carneiro, representaram o ANDES-SN no curso, o 1º vice-presidente do Sindicato, Luiz Henrique Schuch, e as jornalistas Renata Mafezzoli e Rejane Medeiros. As associações docentes da Bahia estiveram bem representadas no curso. Estavam presentes as jornalistas das associações docentes de Feira de Santana (Adufs), do Sudoeste Baiano (Adusb) e Santa Cruz (Adusc), além de diretores da Adusb e da Adufs. A Associação dos Docentes da Universidade Federal do Espírito Santo (Adufes) e da Universidade Federal de Pelotas (Adufpel) também enviaram jornalistas.
Participante frequente dos cursos do NPC, a professora Maslowa Freitas, da Universidade Estadual de Feira de Santana, é só elogios para a atividade. “Desde que nós, da Adufs, resolvemos priorizar a comunicação da nossa entidade, que diretores e jornalistas participam dos cursos. Acredito que houve um salto de qualidade no nosso diálogo com os docentes, pois esses cursos contribuem com a formação e atualização, principalmente sobre temas relacionados ao pensamento de esquerda”, elogiou.
Para a jornalista Giselle Pereira, da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Espírito Santo, que participou do curso pela segunda vez, ele permite a troca de experiências entre os profissionais de comunicação e os sindicalistas, sendo também um espaço de formação. “A comunicação sindical inclui temas que não os estritamente corporativos. Em cursos como este, temos a oportunidade de debater outras pautas, enriquecendo assim o nosso trabalho”, enfatizou.
A nossa dor não sai no jornal
O curso começou no dia 21 de novembro com uma palestra do professor da Universidade Federal Fluminense Dênis de Morais, que falou sobre experiências democratizadoras da comunicação na América Latina. Ele enfatizou a experiência da Argentina, que aprovou e está colocando em prática a nova lei dos meios de comunicação. Agora, ao contrário do que ocorre no Brasil, os donos dos meios de comunicação terão limites, o que evitará a propriedade privada, em que uma mesma rede é dona de jornais, rádios e TVs num mesmo território, produzindo, assim, um pensamento único, sem contraditórios.
O painel seguinte tratou do tema “Mídia e criminalização da pobreza”. Em um depoimento emocionado, Débora Silva, mãe de um rapaz assassinado em 2006 pela polícia militar paulista na baixada santista, contou como o assassinato do filho a levou a engajar-se na luta contra a violência policial e a criar o grupo Mães de Maio. Elas querem a federalização dos crimes, o que permitiria a responsabilização dos criminosos, mas o governo federal tem colocado todas as barreiras possíveis.
“Não há interesse de que a morte de trabalhadores por policiais seja investigada. Mas nós continuaremos a denunciar”, afirmou. Hoje o grupo envolve não só as mães dos assassinados em 2006, mas de outras pessoas vítimas da violência policial. A fala de Débora foi seguida pelo professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro José Cláudio Alves e pela socióloga Vera Malaguti, que criticaram como está sendo o processo de “pacificação” das favelas cariocas. Eles denunciaram que as Unidades de Pacificação aprofundam as desigualdades e as segregações socioespaciais no Rio de Janeiro, além de não terem acabado com o tráfico de drogas nos morros ocupados.
Antes do painel sobre criminalização, moradores do Morro do Turco apresentaram o projeto Bonde da Cultura, desenvolvido na comunidade sem o apoio do governo. Músicos cantaram raps, nos quais a realidade é mostrada como ela é, e não como aparece nas novelas globais. Também houve uma apresentação do músico e educador popular Cícero de Crato.
O segundo dia do curso começou com a exposição “A pesquisa sobre a história social do trabalho no Brasil”, no qual a pesquisadora da Unicamp Larissa Correa mostrou que os trabalhadores brasileiros tem uma tradição de luta e resistência, não mostrada pelos historiadores tradicionais.
Jornalismo sindical
Ainda no horário da manhã, foi montada a mesa “Apresentação de experiências de comunicação sindical”. Na ocasião, foi apresentada a experiência da TV Petroleira, de um programa de rádio produzido pelo Sindicato dos Professores do Ensino Básico de Sergipe e transmitido em rede para todo o estado, e de uma revista produzida pelo Sindicato do Judiciário do Rio de Janeiro. Um debate presente nesse painel foi o limite e as possibilidades do jornalismo sindical em pautar assuntos que vão além da pauta corporativa.
Também nesta mesa, o filósofo e ex-metalúrgico Sérgio Bertoni falou sobre o blogoosfero, plataforma livre e colaborativa, desenvolvida de forma colaborativa por blogueiros e ativistas do movimento software livre e cultura digital, com o objetivo de proteger os conteúdos dos blogs e sites de ataques contra a liberdade de expressão. “Pouca gente atenta para o fato, mas tudo o que postam em blogs, sites e nas redes sociais não lhes pertence. Por isso, o facebook tira diariamente páginas do ar que contrariam os interesses da empresa”, destacou Bertoni.
Com o blogoosfero, as pessoas serão donas e responsáveis por tudo o que publicarem. Textos só serão retirados do ar após decisão judicial em última instância.
Bertoni também defendeu a necessidade de uma mobilização social para aprovação do marco civil da internet. “Há uma pressão muito grande das empresas de telecomunicações para que a atual neutralidade da rede seja quebrada. Com isso, os dados de quem tiver mais poderio econômico tramitariam mais rápido. Seria um desastre para os sindicatos, movimentos sociais e quem tem uma opinião discordante do senso comum”, explicou.
Para o 1º vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch, o painel corroborou a posição do Sindicato de pautar em seus veículos (InformANDES mensal impresso, página na internet, e InformANDES online) matérias que vão além dos temas corporativos, mas que dizem respeito ao universo docente. “Sempre buscamos esse equilíbrio. E difícil, mas não desistimos”, afirmou. Durante o curso, foram distribuídas edições do jornal InformANDES e o Plano de Comunicação do Sindicato.
Construção de valores
Na quinta-feira, dia 22, à tarde, ainda houve o painel “Indústria Cultural: rádio, programas policiais, internet e novelas”, que contou com a participação do professor da Universidade Federal Fluminense Kleber Mendonça, do jornalista sergipano Cristian Góes, do professor da PUC gaúcha Pedrinho Guarechi e do comunicador da Rádio Heliópolis Reginaldo Gonçalves.
Kleber Mendonça falou sobre a ação do RJTV de naturalização e justificativa das ações de segurança pública do Estado brasileiro e como a pacificação é exaltada pelo programa, sendo omitidos seus problemas. Reginaldo Gonçalves contou como foi o processo de resistência da comunidade de Heliópolis para ter uma rádio comunitária e como ele, que entrou na rádio para tocar seus raps, foi se apaixonando pelo projeto. Pedrinho Guarechi falou sobre o papel da novela na construção de valores. Ele mostrou os cinco minutos iniciais da novela Salve Jorge e argumentou que ela, ao exaltar o Exército, é uma resposta à Comissão da Verdade. “Nunca uma novela é neutra. Se pararmos para pensar um pouco veremos o que há por trás”, disse. Pedrinho aposta que em breve será veiculada alguma novela construída para tentar legitimar também as ações da Aeronáutica.
Ainda nesse dia, à noite, houve o debate “Mulher na mídia/homofobia”, com Nalu Faria, da Marcha Mundial de Mulheres e Luis Mott, do grupo gay da Bahiaa. A noite terminou com a exibição do filme Carlos Mariguella, de Carlos Pronzato.
Desafios
Na sexta-feira (23) o tema central dos painéis era “Os desafios para a comunicação de esquerda”. As atividades começaram com a exposição “Grandes corporações de comunicação nas Américas”, feita pelo ilustrador Gilberto Maringoni, que criticou o monopólio da mídia no Brasil e elogiou o que está sendo feito por Cristina Kirchner, na Argentina.
Em seguida, o professor da Universidade Federal de Santa Catarina, Nildo Ouriques, a cientista política Vânia Bambirra, o historiador Miguel Borba de Sá e o embaixador Samuel Pinheiro debateram os “Desafios da esquerda na América Latina”. Apesar das avaliações divergentes acerca dos governos Lula/Dilma, todos os palestrantes afirmaram que qualquer proposta deve levar em consideração a realidade concreta do país.
O debate seguinte tratou de “Internet: blogs e twitter”, que contou com a participação dos jornalistas Leandro Fortes (Carta Capital) e Renato Rovai (Revista Fórum). Ambos ressaltaram a necessidade de os movimentos sociais se apropriarem das mídias sociais como forma de produzir a contra-hegemonia.
“A mídia e o debate sobre a ditadura de 64” foi o tema do painel realizada das 17h às 19h, que contou com a participação dos jornalistas Chico Otávio (O Globo) e Cristina Chacel, autora do livro “Seu amigo esteve aqui”, sobre o militante do VAR-Palmares Carlos Alberto Soares Freitas, desaparecido no regime militar. Também participou do debate Victória Gabrois, do grupo Tortura Nunca Mais no Rio de Janeiro.
Os jornalistas relataram as pesquisas que fizeram para tentar jogar luz sobre os acontecimentos ocorridos nos porões da ditadura. Já Victória Gabrois acusou os militares de negarem aos familiares informações sobre os desaparecidos. Ela também criticou a Comissão da Verdade “que foi formada para dar uma satisfação para a sociedade, mas não para averiguar os fatos”, denunciou.
Em seguida, na noite do dia 23, ainda houve a exposição do tema “Marco Regulatório e o Conselho Nacional de Comunicação”. A importância de se aprovar uma nova lei para a comunicação no Brasil que democratize o setor e amplie a liberdade de expressão foi destacada pelos palestrantes, o jornalista e membro do Coletivo Intervozes, João Brant, e a jornalista e membro do Centro de Estudos da Mídia Barão de Itararé. Os dois também fazem parte do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC).
Os dois explicaram como está sendo a luta para que seja estabelecido um marco regulatório das comunicações no Brasil, assim como fez Cristina Kirchner na Argentina, e por que os barões da mídia brasileira são totalmente contrários uma lei que garanta a liberdade de expressão. “A comunicação é um serviço público e como tal deve ser regulada, como é o transporte público, por exemplo”, defendeu Brant.
TV Pública
O último painel do curso, realizado na manhã do sábado (24), debateu o tema “TV no Brasil: o conceito de pública, privada e estatal”. Os palestrantes foram o professor da USP e ouvidor da TV Brasil, Laurindo Leal Filho; o jornalista Beto Almeida e o professor da Faculdade de Comunicação Hélio Alonso Gabriel Mendes.
Laurindo Leal destacou que não há uma dicotomia radical entre a TV Pública e a TV Estatal, já que a titularidade de qualquer empresa pública é do Estado. “Não há uma TV absolutamente pública, nem mesmo a BBC. O que torna uma TV mais, ou menos, pública são os conselhos gestores, que representam a sociedade na televisão”, frisou.
Ele informou que está havendo uma consulta para a escolha de dois representantes no Conselho Gestor da EBC e aconselhou as entidades sindicais a procurarem interferir nesse processo, indicando nomes.
Laurindo Leal, assim como outros palestrantes que o antecederam, lembrou que a TV e o rádio comerciais dependem de concessões, sendo, portanto, pública. “O problema é que está fora do universo simbólico das pessoas que toda TV e todo rádio são públicas”, argumentou.
O jornalista Beto Almeida enfatizou que toda discussão sobre TV pública deve ser olhada sob o espectro da luta de classes. “É preciso uma luta constante para que essas TVs passem a defender os interesses dos trabalhadores”, afirmou. Ele criticou o fato de a TV Brasil e a Agência Brasil, ambas públicas, repetirem a pauta da mídia tradicional. Também criticou o fato de o governo brasileiro não ter tido a coragem de apresentar uma lei dos meios de comunicação, como fizeram a Argentina e a Venezuela.
A cobertura dada pela TV comercial às lutas dos trabalhadores foi criticada pelo professor Gabriel Mendes. “Sempre mostram as consequências da greve, como uma entrevista com alguém que perdeu uma consulta médica devido a uma greve de motoristas de ônibus, mas nunca as causas que levaram os trabalhadores a parar”, exemplificou.
Mendes observou que as TVs comerciais sempre simplificam as questões, sem problematizá-las. “Não explicam que austeridade significa corte de gastos nas áreas sociais”, citou. Para que haja uma verdadeira liberdade de expressão, o professor da Facha defendeu que o Estado financie a mídia alternativa, que transmitiria outro conteúdo, baseado na ética e em valores como generosidade e justiça social.
Oficinas
No sábado à tarde, foram realizadas as seguintes oficinas: audiovisual (ministrada pelo coletivo Tatuzaroio), linguagem e hegemonia (ministrada pelo fundador do NPC Vito Giannotti), o mundo do facebook (ministrada por Arthur William, da TV Brasil, da Associação das Rádios Comunitárias e do NPC), educação e política (ministrada pelo professor da Uerj Gaudêncio Frigoto), a herança de Gramsci (ministrada pelo professor da Uerj e da Unirio Rodrigo Castelo) e Rádio Comunitária (também ministrada por Arthur William).
No domingo pela manhã foi exibido o filme “As neves de Kilimanjaro”, seguido de um debate com debate com Vito Giannotti e com a professora Camila do Valle AwáGuajá GuaraniKaiowá. O filme dá exemplos de solidariedade, que foi apontada como o caminho para a construção de um outro mundo."


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